Novembro 24, 2024

Em 2019, partidos foram mais ativos do que a própria PGR em ações no STF Featured

Das 333 ações questionando leis e normas que chegaram ao Supremo Tribunal Federal (STF) em 2019, 91 são de autoria de partidos políticos. As legendas foram, portanto, responsáveis por 27% desse tipo de demanda no ano passado. A Procuradoria-Geral da República (PGR) aparece em segundo lugar, com 50 ações. O levantamento, realizado pelo GLOBO, mostra que os partidos são diretamente responsáveis pelo fenômeno que eles mesmos costumam denunciar: o de que a mais alta Corte do país judicializa a atividade política.

A contabilidade foi feita entre as chamadas ações de controle concentrado: Ação Declaratória de constitucionalidade (ADC), Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO) e Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF). Esses são os instrumentos para se questionar a legalidade de normas federais, estaduais e municipais.

Entre os partidos, quem mais ingressou com esse tipo de ação no Supremo foi o Rede Sustentabilidade, com 18 processos. Em seguida vêm o PDT, com 14; o PSOL e o PSB, com dez cada; o PT, com oito; o Solidariedade, com cinco; e o PCdoB, com quatro.

A tendência nem sempre foi essa na Corte. Um outro levantamento mais amplo feito pelo próprio STF mostra que, desde 1988, foram ajuizadas 6.977 ações de controle concentrado. Desse total, 1.098 são de autoria da PGR. O Departamento de Estatística do tribunal não compilou o total de ações apresentadas por todos os partidos políticos nessa época. No ranking, aparecem apenas os maiores demandantes, considerando-se as siglas individualmente e outras entidades. Com essa metodologia, os partidos aparecem em segundo lugar na autoria das ações, com 182. No período, o partido autor do maior número de processos foi o PDT, com 135. Em seguida vêm Rede, PSB e PSOL, cada um com 14 ações.

De acordo com a Constituição Federal, os partidos políticos têm legitimidade para ajuizar ações de controle concentrado no STF. Também têm essa prerrogativa o presidente da República, a Mesa do Senado, a Mesa da Câmara dos Deputados, as Mesas das Assembleias Legislativas e da Câmara Legislativa do Distrito Federal, governadores, o procurador-geral da República, a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e confederações sindicais ou entidades de classe de abrangência nacional.

Caso do juiz de garantias
Em um dos casos mais recentes, o PSL, partido pelo qual o presidente Jair Bolsonaro foi eleito e do qual saiu em novembro de 2019, entrou com uma ação no STF contra a criação do chamado juiz de garantias, instituída dentro do pacote anticrime aprovado pelo Congresso. Antes de a figura do juiz de garantias virar lei, o ministro da Justiça, Sergio Moro, chegou a recomendar que Bolsonaro vetasse a proposta. O presidente preferiu não vetar, alegando que nem sempre pode contrariar o Congresso. A nova lei estabelece uma divisão de tarefas, com dois magistrados no mesmo caso, um responsável por conduzir decisões ao longo do processo e o outro, com a tarefa de dar a sentença. O Podemos também entrou com a ação, com o mesmo pedido.

O presidente do PSB, Carlos Siqueira, diz que recorrer ao Supremo sempre foi “um tipo de atuação” do partido.

— O problema é quando, em vez de garantir a constitucionalidade das leis, o Supremo legisla em matérias que não são de sua competência. Mas quando encontramos normas prejudiciais para a população, nós temos de agir. É o caso de uma ação nossa que está na pauta do STF para mês que vem, contra a proibição de doação de sangue por homens homossexuais — diz Siqueira.

Está marcado para 11 de março a continuidade do julgamento de uma ação proposta pelo PSB em junho de 2016. O partido questiona a validade da portaria 158, de 2016, do Ministério da Saúde, que lista uma série de impedimentos para pessoas doarem sangue pelo período de 12 meses. Um dos artigos refere-se a “homens que tiveram relações sexuais com outros homens e/ou as parceiras sexuais destes”.

Para os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber e Luiz Fux, a regra atual trata essas pessoas de forma preconceituosa. Alexandre de Moraes votou de forma diferente. Para ele, o material ficaria estocado nos bancos de sangue pelo período da janela sorológica, a ser definido por técnicos de saúde, para a futura testagem. Outros seis ministros ainda votarão.

Entre as principais ações ajuizadas por partidos no STF no ano passado está uma da Rede, que contestou a decisão do ministro Alexandre de Moraes de retirar do ar reportagem da revista digital Crusoé que fazia referência ao presidente da Corte, Dias Toffoli. A decisão do ministro foi tomada no inquérito que apura ataques ao Supremo e a ministros. Segundo a Rede, Moraes violou os princípios da liberdade de expressão, manifestação e de imprensa. O ministro acabou revendo a decisão e autorizando que a reportagem voltasse ao ar.

O deputado Paulo Pimenta (RS) diz que o PT só busca o Judiciário em casos de “ataques à Constituição”.

— Uma coisa é buscar o Judiciário para elucidar uma divergência política. Outra coisa é para evitar iniciativas flagrantemente inconstitucionais. Nossas ações são baseadas no zelo ao cumprimento da Constituição. E o Supremo tem esse dever — diz o parlamentar, que liderou o PT na Câmara em 2019.

Ele destaca duas ações ingressadas pelo PT em 2019: contra a venda de estatais e pela garantia de liberdade de expressão nas universidades.

O GLOBO
Portal Santo André em Foco

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