Novembro 24, 2024

Óleo causa pior desastre já visto em recifes de corais brasileiros Featured

Considerada uma das mais belas e limpas praias do Brasil, Carneiros , em Tamandaré, Pernambuco , retratava nesta sexta-feira a devastação causada pelo maior desastre com petróleo em extensão do país. As manchas de óleo cobriram a areia e recifes de coral . E, a despeito do esforço de voluntários , os corais são praticamente impossíveis de limpar, pois o óleo é tóxico para eles e os produtos de descontaminação (dispersantes) existentes são ainda mais nocivos.

Especialistas afirmam que este já é o pior desastre da história para os corais brasileiros, porque atingiu os recifes num momento em que se recuperavam de um branqueamento (processo que leva à morte) sem precedentes, causado pela elevação da temperatura do mar. Importantes para o turismo, os recifes de corais são fundamentais para a atividade pesqueira, pois numerosas espécies de peixes, crustáceos e moluscos precisam deles para se reproduzir.

— Nunca houve um ano tão terrível para os corais do Brasil quanto este. Tivemos um branqueamento recorde de corais em maio e junho, com mortalidade de até 90%, no caso de uma espécie importante. Agora, o óleo atinge os corais nordestinos num momento em que eles começavam a se recuperar — destaca Gustavo Duarte, pesquisador do AquaRio e do Laboratório de Ecologia Microbiana e Molecular (LEMM) da UFRJ, onde são desenvolvidos estudos de vanguarda sobre corais.

Paraísos maculados
Carneiros fica no norte da Costa dos Corais, entre Alagoas e Pernambuco, a segunda maior barreira de recifes de corais do mundo. Com cerca de 150 quilômetros, ela só é menor do que a Grande Barreira, na Austrália.

Também junto à fronteira com Alagoas, uma enorme mancha de óleo foi avistada no mar, sobre recifes, em São José da Coroa Grande. O óleo voltou a atingir ontem Pernambuco e Alagoas, onde chegou à praia de Maragogi.

Ninguém sabe dizer ainda quantos recifes coralinos foram afetados, já que as manchas se espalham por 187 municípios de nove estados e mais de 2.200 quilômetros de litoral.

Mas Barbara Pinheiro, do Laboratório de Recifes de Corais e Mudanças Globais da Universidade Federal da Bahia, diz que, além da Costa dos Corais, foram atingidos recifes no Pontal do Peba (foz do São Francisco, Alagoas), na Praia do Forte e na Ilha de Itaparica, na Bahia. Cientistas dizem que levará anos até que os danos possam ser bem avaliados.

Raquel Peixoto, que coordena as pesquisas no LEMM e no AquaRio, explica que o óleo afeta o metabolismo e a reprodução dos corais e das algas que vivem em simbiose com eles e lhes dão cor e alimento. É a morte das algas que causa o branqueamento e, em consequência, a destruição.

Um estudo inédito do LEMM revelou que mais de 90% dos corais da espécie Millepora alcicornis, uma das mais importantes construtoras de recifes no Brasil, morreram neste ano. Um coral de 50 cm pode levar 20 anos até se recuperar. Outras espécies também foram afetadas pelo branqueamento, entre elas o coral-cérebro, que só existe no Brasil e cujo período de reprodução começará quatro dias antes da próxima lua nova, no dia 28.

— Recifes atingidos por óleo são como florestas que pegaram fogo, a recuperação leva décadas — diz ela.

O biólogo marinho Clemente Coelho Júnior, do Instituto BiomaBrasil e da Universidade de Pernambuco (UPE), diz que a situação é muito preocupante:

— Ainda não sabemos o quanto dos recifes foram comprometidos pelo óleo. Ele também entrou nos mangues de rios da região. Não entendemos até agora porque o governo federal não decretou emergência — lamenta ele, que acompanha o desastre desde o início.

Bolsonaro insinua crime
Ontem, o presidente Jair Bolsonaro questionou, numa transmissão ao vivo por suas redes sociais, se não haveria uma relação entre o derramamento de óleo e o leilão da cessão onerosa do pré-sal, marcado para 6 de novembro.

— A gente tem que ter responsabilidade no que fala, mas poderia ser uma ação criminosa para prejudicar esse leilão? É uma pergunta que está no ar.

Já o Ministério Público Federal entrou com uma ação contra a União por omissão, pedindo que a Justiça obrigue o governo federal a acionar o Plano Nacional de Contingência dentro de 24 horas . A ação requer uma multa diária de R$ 1 milhão em caso de descumprimento.

O MPF afirma que a União foi omissa em não acionar o plano e considera que a situação precisa ser reparada pelo Poder Judiciário. O pedido abrange os nove estados afetados. Para os procuradores, a União se limitou a “fazer limpeza de praias” e não tomou medidas necessárias voltadas para áreas sensíveis.

O desastre também causa discussão entre Procons do Nordeste e o de São Paulo. O Fórum do Procons Nordeste criticou a orientação divulgada pelo de SP de que o consumidor teria direito a cancelar ou remarcar a viagem que estivesse programada para a região atingida. Para os nordestinos, isso só seria válido no caso de praias consideradas impróprias.

O Globo
Portal Santo André em Foco

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