Por unanimidade, a Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) mandou soltar nesta terça-feira o ex-presidente Michel Temer e João Baptista Lima Filho, o coronel Lima, dono da empresa Argeplan e amigo do emedebista. Em vez de continuarem presos, eles terão que cumprir algumas medidas cautelares. Estarão proibidos, por exemplo, de manter contato com outros investigados, de mudar de endereço, de deixar o país, fazer negócios com empresas investigadas e de ocupar cargos de direção partidária. Além disso, deverão entregar o passaporte, e terão bens bloqueados.
O julgamento foi liminar, ou seja, não é definitivo. O relator, Antonio Saldanha, e os ministros Laurita Vaz, Rogério Schietti e Nefi Cordeiro entendem que medidas cautelares diversas da prisão são suficientes neste momento. Isso porque Temer e Lima ainda não foram condenados, mas estão apenas presos provisoriamente. Eles são acusados de corrupção nas obras da usina nuclear de Angra 3. O juiz federal Marcelo Bretas, que decretou a prisão, poderá aplicar outras medidas cautelares que entender serem cabíveis.
O relator Antonio Saldanha foi o primeiro a se manifestar no julgamento. Ele destacou que uma prisão provisória, quando ainda não há execução da pena, não pode se basear em "meras conjecturas". Lembrou que, entre os fundamentos para justificá-la, está a contemporaneidade dos delitos. Mas, no caso de Temer, destacou ele, os supostos crimes ocorreram entre 2011 e 2015. Além disso, o ex-presidente não tem mais cargo que torne plausível o risco de delinquir, caso seja solto.
— Além de razoavelmente antigos os fatos, o prestígio político para a empreitada criminosa não mais persiste. Michel Temer deixou a presidência da República no início deste ano e não exerce mais cargo de relevo — disse Saldanha, acrescentando: — Não foi tratado nenhum fato concreto recente do paciente (Temer) para ocultar ou destruir provas.
A investigação apontou uma tentativa de movimentação de R$ 20 milhões da empresa de coronel Lima, ocorrida em outubro do ano passado. Mas Saldanha destacou que o próprio Ministério Público Federal (MPF) reconheceu a necessidade de apurar melhor esse episódio. E afirmou:
— A gravidade dos delitos imputados não constitui argumento por si só para a necessidade da prisão.
Segunda a votar, Laurita Vaz também ressaltou a necessidade da "contemporaneidade" dos supostos delitos para justificar uma prisão provisória. Ela destacou que é importante o combate à corrupção, mas afirmou que isso não pode ser feito de qualquer jeito.
— Não há outro caminho. O Brasil precisa ser passado a limpo. Entretanto essa luta não pode virar caça às bruxas, com ancinhos e tochas nas mãos, buscando culpados sem preocupação com princípios e garantias individuais que foram construídos ao longo de séculos. É dever do Judiciário garantir em todos os casos o devido processo legal — disse Laurita.
Terceiro a votar, Schietti discordou de argumento dos advogados do ex-presidente, para quem a prisão era baseada apenas em delação premiada. Segundo o ministro, há outros elementos no processo, como documentos e relatórios. Mas também entendeu que não ficou demonstrado que Temer pode atrapalhar a investigação. Ele propôs mais algumas medidas cautelares, como a proibição de trabalhar para as empresas investigadas e de ocupar cargos públicos e partidários, além de ter de comparecer periodicamente à Justiça, mas isso não foi analisado ainda pelos demais ministros.
Último a votar, Nefi Cordeiro destacou que um juiz não pode ser símbolo de combate à criminalidade nem agente de Segurança Pública. Ele deve julgar de acordo com a lei e, ao fim do processo, caso haja provas suficientes, condenar alguém. Entendeu também que a prisão de Temer foi ilegal.
— Não se prende hoje porque grave foi o risco antigo. Prende-se provisoriamente por riscos aos processos ou à sociedade. Na prisão provisória é preciso compreender a função cautelar de garantia processual. Neste processo se tem imputação de graves crimes, muitos relacionados à atuação pública do paciente. Renovo a lembrança de ser a cautelar dissipadora de riscos, e não resposta penal — disse Cordeiro, acrescentando: — Não se pode prender porque os fatos são revoltantes. Não se pode prender como resposta a desejos sociais de justiça instantânea.
Nefi cordeiro criticou a figura do "juiz herói":
— Juiz não enfrenta crimes, juiz não é agente de segurança pública, não é controlador da moralidade da social ou dos destinos políticos da nação. O juiz criminal deve conduzir o processo pela lei e pela Constituição, com imparcialidade e, somente ao fim do processo, sopesando adequadamente as provas, reconhecer a culpa ou declarar a absolvição. Juiz não é símbolo de combate à criminalidade.
A Sexta Turma do STJ tem cinco ministros, mas um deles, Sebastião Reis Júnior, se declarou impedido para participar do julgamento. Ele informou já ter trabalhado em escritório contratado pela Eletronuclear, estatal responsável pela usina. Assim, mesmo que obtivesse apenas dois votos favoráveis dentre os quatro possíveis, Temer poderia ser solto. Isso porque o empate favorece os investigados.
Temer e Lima foram presos inicialmente em março, por ordem do juiz Marcelo Bretas, responsável pelos desdobramentos da Lava-Jato no Rio de Janeiro. Poucos dias depois, foram soltos pelo desembargador Ivan Athié, do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), com sede no Rio.
O MPF recorreu da decisão, e o recurso foi levado para votação pelos três integrantes da Primeira Turma do TRF-2, que conta com Athié e mais dois desembargadores: Abel Gomes e Paulo Espírito Santo. Athié votou para manter Temer livre, mas os outros foram favoráveis à prisão. Na última quinta-feira, o ex-presidente se entregou à polícia. Coronel Lima também se entregou.
O Globo
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