O presidente Jair Bolsonaro protocolou, às 17h11 desta sexta-feira (3), ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) por omissão contra o Congresso Nacional. O pedido tramita no STF (Supremo Tribunal Federal) e é assinado também pelo advogado-geral da União, Bruno Bianco Leal. O presidente acusa o poder Legislativo de se omitir na unificação da cobrança de ICMS sobre os combustíveis. A ADO 68 será relatada pela ministra Rosa Weber.
O que Bolsonaro quer é que o STF determine aos deputados e senadores que editem, em 120 dias, lei que uniformize a cobrança do ICMS sobre combustíveis no Brasil. Mesmo se não for editada lei sobre o tema, o presidente pede que o STF estabeleça “interpretação conforme a Constituição ao artigo 4º da Emenda Constitucional nº 33/2001” para determinar a “uniformidade de alíquotas de ICMS-combustíveis (155, § 4º, inciso IV, alínea “a”, da Constituição), reparando-se, assim, as lesões constitucionais”, diz a petição.
Na ação, Bolsonaro afirma ainda que o pedido visa evitar “o comportamento federativo predatório, conhecido como guerra fiscal”, que pode apresentar “risco ao pacto federativo”. Ele diz ainda que a urgência se dá “em decorrência da relevância da matéria e do seu significativo impacto na economia e na vida cotidiana dos cidadãos”.
A ação é uma ofensiva direta aos governadores dos estados e do DF. Na última quinta-feira (2), durante transmissão ao vivo nas redes sociais, Bolsonaro tinha dito que eles desrespeitam a Constituição da República ao cobrar ICMS de forma proporcional. Segundo ele, é preciso estabelecer um valor nominal fixo. Antes disso, o presidente tinha desafiado os governadores a zerar a alíquota do imposto.
O imposto virou uma estratégia para tentar responsabilizar os estados e o Distrito Federal pelo preço do combustível no posto. “O imposto federal é R$ 0,74, mas no fim da linha chega a quase R$ 7. Aí tem o frete, a margem de lucro dos postos e o grande mistério que é o ICMS, um percentual que os governadores cobram em cima do preço final da bomba. E não na origem”, disse.
“A mesma coisa tenho falado do gás de cozinha. Arredondando pra cima, um botijão custa R$50. Na ponta da linha, está chegando a R$ 130. Eu zerei os impostos federais para o gás de cozinha. O que pesa aí? ICMS, que é imposto estadual, o frete, e a margem de lucro da ponta da linha. Eu comentei com um governador e fiz uma proposta para ver se é possível zerar o ICMS. Toda vez que tem renúncia de receita, tem que apresentar uma fonte alternativa. Como fiz no PIS/Cofins no gás de cozinha. Se ele conseguir, vamos entrar em uma outra briga, propor a venda direta”, disse.
Bolsonaro afirmou ainda que tem sido alvo de “alguns poucos governadores” pelo preço do gás. “Está caro. Mas não me critique. Eu zerei o imposto do gás de cozinha. E você, governador, está cobrando ICMS. Exatamente quem usa o botijão é o mais pobre. Vamos zerar o ICMS? O parlamento vai nos apoiar, com certeza”, afirmou.
Governadores criticam
Quando disse que enviaria ao Congresso Nacional um projeto para que o ICMS estadual seja cobrado sobre os combustíveis nas refinarias e não nas bombas, no início deste ano, o Comitê Nacional de Secretários de Fazenda dos Estados e do Distrito Federal (Comsefaz) se manifestou, por meio de nota, para dizer que o aumento dos preços dos combustíveis não tem qualquer relação com a política tributária dos estados, mas "são fruto da alteração da política de gerência de preços por parte da Petrobras, que prevê reajustes baseados na paridade do mercado internacional, repassando ao preço dos combustíveis toda a instabilidade do cenário externo do setor e dos mercados financeiros internacionais".
O governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), criticou a pressão do presidente sob os estados para reduzir o imposto sobre os combustíveis. Ele elevou o tom ao dizer que não é "razoável, sensato e lógico" Bolsonaro querer que os estados façam uma redução abrupta do ICMS, enquanto o governo federal impõe aos governadores despesas maiores.
Leite, que administra uma saída para a crise fiscal de décadas do estado, reclamou do aumento de 12,8% do piso do magistério num cenário de crescimento de 1% e inflação de 4%. O governador do PSDB pediu um debate “responsável”. Leite contou que o aumento de 12,8% do piso do magistério, que é definido pelo governo federal, elevou em R$ 350 milhões as despesas do governo gaúcho.
"A forma como esse debate está se travando pela imprensa e declarações em redes sociais não é formato para quem quer resolver o assunto. Se queremos resolver o assunto, que sentemos e conversemos para efetivamente resolvermos", disse.
O governador de São Paulo, João Doria (PSDB), tinha criticado a intenção do governo federal de intervir no ICMS — de responsabilidade dos Estados — que incide sobre os combustíveis. Segundo Doria, "não é cabível que o presidente da República queira vulnerabilizar o equilíbrio fiscal dos Estados brasileiros, transferindo, sob qualquer aspecto, a responsabilidade pela eliminação ou redução do ICMS do combustível para os Estados".
O governador disse, ainda, que o presidente Jair Bolsonaro tem mecanismos tanto em âmbito federal como da estatal Petrobras para estabelecer "o entendimento que julgar conveniente" para reduzir o preço dos combustíveis, sem que haja pena para as unidades federativas.
Segundo o governador, "a maior parte do preço do diesel, 47%, é determinado pela Petrobras. O ICMS é responsável por uma pequena fatia do preço final do produto, no caso de São Paulo, 13,3%".
"Em 2020, a Petrobras promoveu 32 reajustes de diesel. A Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustível (ANP) revelou que o preço médio do diesel subiu sete semanas consecutivas nos postos de combustível do Brasil", afirmou Doria, durante entrevista coletiva no Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista.
Especialista acredita em improcedência da ação
O advogado constitucionalista João Pedro Mello acredita que o STF não irá impor mais uma "restrição ao federalismo" e não vai julgar a ação procedente.
"No Brasil, diferentemente de países como os Estados Unidos, grande parte das receitas dos estados vem de repasses da União. Isso torna os estados e o DF muito dependentes financeiramente da União e enfraquece nosso federalismo. Por isso, dentro do espaço de arrecadação tributária que os estados têm — que inclui o ICMS — é legítimo que eles criem estratégias para disputar investimentos com os outros estados. É claro que podem haver abusos, mas esses já têm sido coibidos pela atual jurisprudência do STF, que atribui, por exemplo, um papel muito importante ao Confaz (Conselho Nacional de Política Fazendária). A jurisprudência do Supremo sobre federalismo tem sido muito centralizadora em outros pontos e já há hoje um incômodo em relação a isso, inclusive na própria corte. Por isso, nao penso que o tribunal vá impor mais essa restrição ao federalismo no Brasil", analisa.
R7
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