Em novo depoimento prestado no inquérito sobre suspeita de interferências do presidente Jair Bolsonaro na Polícia Federal, o ex-superintendente da PF no Rio Carlos Henrique Oliveira revelou aos investigadores que participou de um encontro privado com Bolsonaro, a convite do delegado Alexandre Ramagem, que à época já era diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin). Segundo o depoimento, o encontro ocorreu no segundo semestre de 2019, e Ramagem lhe disse que seria "importante" que ele conhecesse o presidente.
Em agosto de 2019, Bolsonaro entrou em rota de colisão com a PF por tentar indicar um nome de sua confiança para o cargo de superintendente do Rio. A nomeação foi barrada e a PF escolheu Carlos Henrique. Na ocasião, havia um inquérito eleitoral em curso na Superintendência do Rio contra o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), sob suspeita de ocultação de bens. Também houve uma citação a Bolsonaro na investigação do caso Marielle, por causa do depoimento do porteiro de seu condomínio, e a PF foi acionada para interrogá-lo. O encontro de Carlos Henrique com o presidente ocorreu sob esse contexto. Sua nomeação para a Superintendência só foi oficializada em dezembro daquele ano.
Atual número dois da PF, Oliveira havia prestado depoimento na semana passada, mas pediu para ser ouvido novamente pela Polícia Federal, porque gostaria de corrigir a informação. Neste novo depoimento, ele revela que o convite para ocupar o cargo de diretor-executivo da PF partiu do próprio Ramagem no dia 27 de abril, quando ele se preparava para ocupar a direção-geral da Polícia Federal por indicação de Bolsonaro. Após a decisão judicial que barrou a indicação de Ramagem para o comando da PF, o novo indicado ao cargo, Rolando Alexandre de Souza, manteve o convite feito anteriormente por Ramagem e oficializou Carlos Henrique Oliveira na direção executiva da PF.
As informações prestadas por Carlos Henrique reforçam o interesse de Bolsonaro na PF do Rio e a proximidade do presidente com Ramagem. Quando havia sido indicado para assumir a Superintendência da PF do Rio, no segundo semestre de 2019, Carlos Henrique relata que estava em Brasília e foi chamado por Ramagem para um encontro privado com o presidente.
"Havia um convite prévio do delegado Alexandre Ramagem para que o depoente comparecesse numa audiência com o presidente Jair Bolsonaro", relatou no seu depoimento. Segundo Carlos Henrique, o então ministro da Justiça Sergio Moro e o então diretor-geral da PF Maurício Valeixo foram informados do convite e autorizaram o encontro, mas não participaram da reunião. "A reunião ocorreu no Palácio do Planalto, tendo participado apenas o depoente, o delegado Alexandre Ramagem e o presidente Jair Bolsonaro", afirmou.
Segundo seu relato, Bolsonaro contou sobre sua trajetória política mas não falou sobre investigações em andamento na Superintendência do Rio.
"Perguntado se o presidente Jair Bolsonaro sabia que o depoente havia sido indicado para a Superintendência da Polícia Federal do Rio de Janeiro, o depoente respondeu que o presidente não disse isso diretamente, mas que isso já era um dado público à época", afirmou no depoimento. Prossegue Carlos Henrique: "Não foi declarado nenhum objetivo específico para a sua audiência com o presidente Jair Bolsonaro; que o delegado Alexandre Ramagem apenas pontuou que seria importante o depoente conhecer o presidente Jair Bolsonaro".
Durante a gestão de Carlos Henrique, Bolsonaro pediu à PF do Rio para tomar o depoimento do porteiro do seu condomínio que havia dado declarações apontando que o acusado de ter assassinado a vereadora Marielle Franco pediu para ir à casa do presidente no dia do crime. A PF abriu inquérito e ouviu o porteiro, que voltou atrás nas declarações.
Também na gestão de Carlos Henrique, havia um inquérito eleitoral contra o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) em andamento na PF do Rio. A corporação pediu arquivamento do inquérito em março sem quebrar os sigilos do senador que foi arquivado em março sem quebras de sigilo.
Neste depoimento, o atual diretor-executivo da PF também admitiu que prestou informações incompletas anteriormente. Isso porque, na semana passada, ele havia sido questionado por duas vezes se Ramagem o sondou para ocupar algum cargo na direção-geral da PF e Carlos Henrique negou. Esse foi o principal motivo pelo qual ele pediu para prestar um novo depoimento aos investigadores do caso.
"Na ocasião o depoente afirmou que ninguém o procurou", disse. "Na realidade o depoente gostaria de esclarecer que foi procurado no dia 27 de abril do corrento ano pelo delegado de polícia Alexandre Ramagem, que perguntou para ele, depoente, se aceitaria ser diretor executivo da Polícia Federal durante sua gestão; que o depoente respondeu que sim", afirmou no depoimento.
'Carta branca'
Na noite desta terça-feira, Bolsonaro disse ter dado "carta branca" para o novo diretor-geral da PF, Rolando Alexandre de Souza, nomear os superintendetes.
— Eu indiquei, está na lei, o superintendente, o senhor Rolando Alexandre. E ele tem carta branca. Qualquer troca ele que vai fazer.
O presidente também voltou a dizer que havia um "problema de produtividade" no órgão e citou ter reclamado com frequência da situação no Rio de Janeiro.
— O que eu sempre falei da Polícia Federal, lá trás, tinha que ter liberdade para trabalhar. Parece que tinha algum problema de produtividade em alguns estados. O próprio Rio de Janeiro, meu estado, sempre reclamei...Não impûs nenhum nome. Já tem operações em andamento prendendo gente no Rio de Janeiro.
O Globo
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