A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado aprovou nesta quarta-feira (22) um projeto que prevê punições para a discriminação ou preconceito por sexo, orientação sexual e identidade de gênero.
A proposta, que criminaliza a homofobia, promove alterações na legislação que trata dos crimes resultantes de preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.
O projeto é de autoria do senador Weverton Rocha (PDT-MA), mas foi aprovado na forma de um substitutivo proposto pelo relator Alessandro Vieira (Cidadania-SE).
Por se tratar de um substitutivo, o texto terá de passar por nova votação na CCJ, onde poderá sofrer novas modificações. Se aprovada pelo colegiado, a proposta seguirá para análise da Câmara dos Deputados.
“Já passa do tempo de se promover a efetiva proteção às vítimas potenciais da discriminação e preconceito em razão da orientação sexual ou da identidade de gênero”, afirmou Vieira em seu relatório.
Em seu relatório, Alessandro Vieira propôs isentar de punição quem impedir ou restringir “manifestação razoável de afetividade” em templos religiosos.
Questionado se o termo seria subjetivo, podendo abrir margem para diferentes interpretações para o que é "razoável", o senador respondeu que "a interpretação da lei sempre exige o bom senso". "É para isso que a gente tem juiz, magistrado, para fazer análise disso", disse.
Segundo ele, o que se quis assegurar é que qualquer cidadão, casal ou pessoa, independente do sexo, que quer ter sua "manifestação moderada de afeto" tenha isso respeitado.
Punições
A proposta prevê reclusão de um a três anos, além do pagamento de multa, para quem praticar, induzir ou incitar a intolerância, discriminação ou preconceito de orientação sexual ou identidade de gênero.
Também segundo o projeto, quem, em razão de preconceito de orientação sexual, impedir o acesso ou se recusar a atender pessoas em estabelecimentos comerciais ou locais abertos ao público poderá ser punido com reclusão de um a três anos.
Será punido com a mesma pena quem impedir ou restringir “manifestação razoável de afetividade” de qualquer pessoa em local público ou privado aberto ao público, “ressalvados os templos religiosos”.
Vieira afirmou que existe "uma rejeição de um público conservador, tradicional, religioso em relação a essas situações". Segundo o relator, é preciso garantir o respeito e a não discriminação, porém "não pode invadir um templo religioso para fazer coisas que aquela religião não aceita".
O texto também pune quem obstar a promoção funcional em razão de preconceito de orientação sexual ou identidade de gênero; e quem negar emprego em empresa privada por esse motivo.
Supremo
O texto foi analisado pela CCJ do Senado na mesma semana em que está na pauta do Supremo Tribunal Federal (STF) a continuidade do julgamento de uma ação que criminaliza a homofobia.
Quatro ministros da Corte já se posicionaram a favor da criminalização. O julgamento da ação pode ser retomado nesta quinta-feira (23).
Nesta quarta-feira, durante reunião da CCJ, a presidente do colegiado, Simone Tebet (MDB-MS), afirmou que pediria ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), que conversasse com o presidente do STF, Dias Toffoli, para que a Corte aguarde a análise dessa proposta pelo Congresso.
“Até para evitarmos aquilo que constantemente estamos dizendo, do ativismo judicial, que, numa democracia forte, não deve nunca se fazer presente”, justificou Simone.
Segundo a assessoria de Simone Tebet, a parlamentar já procurou Alcolumbre para tratar do assunto.
Câmara
Um dos integrantes mais atuantes da bancada evangélica no Congresso, o deputado federal Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ) articula a votação no plenário da Câmara de um projeto de lei que agrava a pena no caso de lesão corporal ou assassinato motivado por orientação sexual da vítima.
A intenção, segundo ele, é esvaziar as ações em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF) que pede a criminalização da homofobia. As ações foram apresentadas pelo PPS e pela Associação Brasileira de Gays, Lésbicas e Transgêneros (ABGLT). Pedem a criminalização de todas as formas de ofensas, individuais e coletivas, homicídios, agressões e discriminações motivadas pela orientação sexual e/ou identidade de gênero da vítima.
Na avaliação de Cavalcante, se o Congresso aprovar uma proposta tratando da questão, as ações perderiam objeto.
A última versão do texto dele, porém, não prevê a tipificação do crime de homofobia, pois, argumenta, haveria resistência da bancada religiosa.
“Eu não tipifico. Coloco como agravante de pena, o que entendo ser justo. Nós, na comunidade cristã, não temos problema nenhum quanto a isso, porque a gente não quer que ninguém seja agredido por essas questões. Agora, mais do que isso, temos nossos limites na frente evangélica”, diz Cavalcante.
A fim de viabilizar a aprovação no plenário, ele tem discutido o teor da proposta com o deputado David Miranda (PSOL-RJ), que tem entre as suas bandeiras a defesa dos direitos da comunidade LGBT.
Para Miranda, porém, a última versão do texto de Cavalcante “está muito ruim” e não contempla as demandas da comunidade.
“Essa é uma manobra para retirar o processo do STF. Agravar a pena [como proposta por Cavalcante] é uma consequência do que vai acontecer no STF. Não é o que a gente está alegando”, afirma. Ele defende a criminalização da homofobia até para ter estatística sobre a violência contra a população LGBT.
Outro ponto de discórdia é que o projeto elaborado por Cavalcante não menciona o crime de injúria (ofensa à dignidade de alguém) motivada por homofobia.
Ele conta que, no início, chegou a incluir um dispositivo aumentando a pena para a injúria contra gays, mas recuou diante da pressão vinda de grupos com receio de ferir a liberdade de expressão e religiosa. O temor, segundo Cavalcante, é impedir, por exemplo, um pastor de pregar a relação entre pessoas do mesmo sexo como pecado.
“O nosso problema é: o que que vai ser essa injúria? A gente não quer também que agrida nem verbalmente. Mas a subjetividade da fala é muito ampla e o juiz pode entender que a fala do pastor ou na igreja é ofensa”, alega. “Esse é o nosso receio”, diz.
Também há polêmica em relação a outro trecho do projeto. Segundo Cavalcante, o projeto não define o que é orientação sexual, mas especifica que pedofilia e zoofilia não podem ser consideradas como tal.
“Não defini o que é orientação sexual, porque é uma definição que quem tem que dar é o movimento deles, não sou eu. Mas coloquei o que não é, porque alguns do meu lado têm receio de que eles queiram aproveitar para colocar alguns mais radicais que defendem que pedofilia e zoofilia também são orientação sexual. Dentro do movimento LGBT, tem uma menor parte que defende até isso”, justifica.
Para Miranda, esse trecho é um “absurdo”. “Não é um projeto que contempla a gente. É um projeto típico do Bolsonaro, com característica punitiva, que só aumenta a pena”, diz. Se houver uma tentativa de passar no plenário essa versão do texto, Miranda promete obstrução e mobilizar o movimento LBGT. “Vou fazer a Esplanada [dos Ministérios] ficar colorida”, diz ele.
G1
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