Juristas e políticos criticaram um ataque do líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), à Constituição de 1988, criada por uma assembleia nacional constituinte depois do encerramento da ditadura militar.
Barros fez a declaração em um evento virtual organizado pela Academia Brasileira de Direito Constitucional.
Ele disse que o Brasil está em situação ingovernável e deveria seguir o exemplo do plebiscito do Chile e convocar uma assembleia nacional constituinte para escrever uma nova Constituição.
"Eu pessoalmente defendo uma nova assembleia nacional constituinte. Acho que devemos fazer um plebiscito, como fez o Chile, para que possamos refazer a carta magna e escrever muitas vezes nela a palavra 'deveres', porque a nossa carta só tem direitos e é preciso que o cidadão tenha deveres com a nação", afirmou o líder do governo.
Barros também disse que a Constituição de 1988 tem um poder fiscalizador grande demais. Em 2018, durante a campanha presidencial, o PT chegou a propor uma constituinte e só recuou depois de receber muitas críticas.
No mesmo evento, intitulado "Um dia pela democracia", o ministro Luiz Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, criticou — sem citar o líder do governo — a convocação de uma assembleia constituinte.
"Nós temos no Brasil uma democracia bastante resiliente, que vive sob a Constituição de 1988 há 32 anos recém-completados", afirmou o ministro. "Tivemos momentos dificeis na vida brasileira. Alguns momentos reais, alguns momentos puramente retóricos, mas até hoje ninguém cogitou de uma solução que não fosse o respeito à legalidade constitucional. E o Legislativo funciona e dá limites ao poder. O Judiciário e o Supremo funcionam e dão limites ao poder e, portanto, além de qualquer retórica menos feliz, nós temos instituições sólidas que têm resistido adequadamente a vendavais constantes", complementou.
Em uma rede social, o ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Bruno Dantas condenou a proposta de uma assembleia constituinte.
“Tenho visto gente no Brasil tentando pegar carona no plebiscito chileno para reabrir o debate sobre uma nova Constituição por aqui. Estudar um pouco de história e entender a transição democrática deles e a nossa seria útil. Só para começar”, escreveu.
O ex-ministro da Justiça do governo Bolsonaro, Sergio Moro, afirmou em uma rede social que "o que dificultou a governabilidade do Brasil nos últimos anos foi a corrupção desenfreada e a irresponsabilidade fiscal, não a Constituição de 1988 nem a Justiça ou o Ministério Público".
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) também rebateu as declarações de Ricardo Barros. Nascido no Chile, Maia disse que a situação do país é completamente diferente. No Brasil, segundo ele, o marco final do processo de redemocratização foi a Constituição de 1988. No Chile, esse processo ainda não se concluiu até hoje.
Maia afirmou que o caminho para solucionar os problemas do país é a realização das reformas por meio de emendas e não escrever uma nova Constituição.
"Não podemos de forma nenhuma misturar a história do Brasil com a história do Chile. O Brasil teve uma transição democrática e aprovou uma Constituição nesse processo que culminou com essa aprovação. Neste momento, o Brasil tem muitas urgências, tem muitas emendas constitucionais para reformar a Constituição, a PEC emergencial, a reforma administrativa e a reforma tributária. Vamos ficar no nosso foco. Senão, vamos transmitir insegurança para a sociedade. Qual é a agenda do governo? Qual é a agenda do congresso nacional?
O ex-presidente do Supremo Tribunal Federal ministro Ayres Brito disse que o país se torna ingovernável quando se dá as costas para a Constituição.
"Isso, exatamente, a Constituição, se bem entendida, bem interpretada e bem aplicada conduzirá o Brasil ao melhor dos destinos, um destino politicamente democrático, volto a dizer, filosoficamente humanista e culturalmente civilizado. Tenho certeza disso. É só ler com atenção, não subinterpretar a Constituição, não ter um pé atrás com ela. Enquanto tivermos um pé atrás com a Constituição, o Brasil não irá para a frente", disse.
O ministro Carlos Velloso, que também presidiu o Supremo, disse que é um "golpe" defender agora uma assembleia constituinte".
"Em síntese, seria um golpe de estado porque não se muda a Constituição ao sabor da vontade das pessoas. Não. A Constituição foi feita para durar", declarou.
O Palácio do Planalto não quis comentar as declarações do líder Ricardo Barros.
G1
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