O Plenário do Senado aprovou nesta quarta-feira (2) as mudanças da Câmara dos Deputados sobre o projeto de lei da nova Política Nacional de Segurança de Barragens (PL 550/2019). Com isso, o texto segue agora para sanção. O PL é de autoria da senadora Leila Barros (PSB-DF).
Os senadores acolheram as mudanças dos deputados que retiram do projeto a classificação de poluição ambiental que provoca morte como crime hediondo; a pena de até 20 anos de reclusão para crimes ambientais que resultem em morte; e o aumento no valor de multas. Esses temas serão tratados em outros projetos que já caminham no Congresso Nacional.
A nova lei também deixará de exigir seguro por parte das mineradoras — essa exigência será feita, caso a caso, pela Agência Nacional de Mineração (ANM).
O relator do projeto no Senado, Antonio Anastasia (PSD-MG), decidiu rejeitar duas emendas da Câmara. Uma delas estabelecia que o Plano de Segurança da Barragem (PSB) (documento devido pelo responsável pela estrutura) e suas atualizações deveriam ser aprovados pelo órgão fiscalizador.
— [O dispositivo] torna o órgão fiscalizador avalista do empreendedor em relação ao plano. Um dos princípios da Política Nacional de Segurança de Barragens é o empreendedor ser o responsável legal pela segurança daquela barragem. A determinação não seria producente — justificou o senador.
A outra mudança rejeitada previa que as mineradoras contratassem somente profissionais especializados em segurança de barragens incluídos em cadastro específico criado pelo órgão fiscalizador. Para Anastasia, essa regra criaria uma “reserva de mercado” em detrimento de profissionais capacitados.
Penas
O senador Jorge Kajuru (Cidadania-GO) tentou restabelecer no texto do projeto os valores originais para as multas aplicadas por falhas em barragens. O Senado havia aprovado multas entre R$ 10 mil e R$ 10 bilhões, mas a Câmara reduziu a margem para entre R$ 2 mil e R$ 1 bilhão. Kajuru classificou a alteração como “brutal”.
— O Senado não pode aceitar o valor estabelecido pela Câmara, pois, em muitos casos, é um valor miserável e não cobre o tamanho dos danos causados.
Já o senador Fabiano Contarato (Rede-ES), presidente da Comissão de Meio Ambiente (CMA), lamentou a remoção de dispositivos penais do projeto.
— Não vai haver nem multa administrativa, nem responsabilidade civil, nem responsabilidade criminal, e a única condenada vai ser a família das vítimas, que vai sofrer duplamente, pela dor da perda e pela certeza da impunidade.
O senador Antonio Anastasia argumentou que os valores das multas virão sempre acompanhados de indenizações estabelecidas pela Justiça. Também observou que multas muito expressivas poderiam estar além da capacidade de pagamento da maioria das empresas, o que significaria que o poder público nunca poderia cobrar o dinheiro devido.
Já no caso das penas e crimes, Anastasia lembrou que há dois projetos em tramitação no Senado que tratam desses assuntos. O PL 3.915/2019, que já pode ser votado pelo Plenário, altera a Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605, de 1998) para tipificar o crime de desastre ecológico de grande proporção ou que produza estado de calamidade pública. O PL 2.787/2019 tipifica o crime de “ecocídio”, e está nas mãos de Contarato, que é o relator.
Veto
O líder do governo, senador Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), antecipou que o presidente Jair Bolsonaro poderá vetar pelo menos um ponto do projeto. Trata-se de um dispositivo que exige garantias financeiras (como seguro ou caução) para barragens de acumulação de água que não sejam destinadas à geração de energia elétrica.
Segundo o senador Marcos Rogério (DEM-RO), presidente da Comissão de Infraestrutura (CI), essa norma poderá prejudicar a própria administração pública, visto que diversas barragens desse tipo são mantidas e operadas pela União, por estados e por municípios.
— Há uma enorme dificuldade de obtenção de recursos para a construção dessas barragens, uma vez que a maioria delas não têm receitas oriundas de tarifas. Para evitar uma paralisação nas políticas de segurança hídrica penso que seja prudente vetar esse dispositivo — avaliou o senador.
Conteúdo
O PL 550 foi apresentado pela senadora Leila Barros (PSB-DF), no início de 2019, em resposta ao desastre causado pelo rompimento de uma barragem da Vale em Brumadinho (MG). O evento matou 259 pessoas. O Senado aprovou a primeira versão ainda em fevereiro daquele ano.
O texto proíbe o uso de barragens a montante — como a que provocou o desastre. A barragem a montante é aquela construída com a colocação de camadas sucessivas de rejeito mineral uma em cima da outra, tornando a estrutura suscetível a infiltrações de água que diminuem sua estabilidade e potencializam a chance de rompimento. As mineradoras terão até 25 de fevereiro de 2022 para acabar com as barragens desse tipo. No entanto, esse prazo pode ser prorrogado pela Agência Nacional de Mineração (ANM) caso haja inviabilidade técnica para a execução do serviço no tempo previsto. A decisão de prorrogar precisa ser referendada pelo órgão ambiental.
O projeto também aumenta para até R$ 1 bilhão a multa aplicável em caso de acidente e torna obrigatória a elaboração de Plano de Ação Emergencial pelos responsáveis por barragens. Inclui, ainda, as áreas degradas por acidentes ou desastres ambientais entre as que têm prioridade para receber recursos do Fundo Nacional de Meio Ambiente (FNMA).
Seguro
Os deputados também retiraram do texto original a exigência de seguro por partes das mineradoras. Segundo o substitutivo, caberá à Agência Nacional de Mineração (ANM) pedir ou não caução, seguro, fiança ou outras garantias para a reparação dos danos à vida humana, ao meio ambiente e ao patrimônio público.
A garantia poderá ser exigida no caso de barragem de rejeitos de mineração ou de resíduos industriais ou nucleares classificada como de médio e alto risco. Para as barragens de acumulação de água, o órgão fiscalizador poderá exigir o seguro no caso daquelas de alto risco, inclusive se for para aproveitamento hidrelétrico. As empresas das quais for exigido esse tipo de seguro terão dois anos para providenciá-lo.
Também foi retirada do texto a determinação de que empresas responsáveis por acidentes em barragens continuem a pagar aos municípios atingidos os royalties devidos, mesmo se houver interrupção das atividades.
Infrações
O substitutivo da Câmara é mais detalhado do que o projeto original em relação às infrações administrativas relacionadas às barragens. Segundo o texto, o infrator pode sofrer penalidades de advertência; multa simples; multa diária; embargo de obra ou atividade; demolição de obra; suspensão parcial ou total de atividades; apreensão de minérios, bens e equipamentos; perda do direito de exploração; ou sanção restritiva de direitos.
As sanções restritivas de direito são: suspensão ou cancelamento de licença, de registro, de concessão, de permissão ou de autorização; perda ou restrição de incentivos e de benefícios fiscais; e perda ou suspensão da participação em linhas de financiamento em estabelecimentos oficiais de crédito.
Os valores das multas variam de R$ 2 mil a R$ 1 bilhão. Os recursos arrecadados em deverão ser destinados para a melhoria das ações dos órgãos fiscalizadores.
A decisão sobre a penalidade deve levar em consideração a gravidade do fato, os antecedentes do infrator e a situação econômica (no caso de multa). O texto permite a conversão da multa simples em serviços socioambientais na bacia hidrográfica onde o empreendimento se localiza e condicionamento da multa diária às infrações que se prolongam no tempo.
O substitutivo traz ainda os prazos máximos para andamento dos processos: 20 dias para o infrator oferecer defesa contra o auto de infração; 30 dias para julgamento desse auto; 20 dias para o infrator recorrer da decisão condenatória; e 5 dias para o pagamento de multa.
Obrigações
O projeto inclui na lei que cria a Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB) uma série de obrigações do empreendedor que administra essas estruturas. Entre elas, está a exigência de notificar imediatamente o órgão fiscalizador, o órgão ambiental e o órgão de proteção e defesa civil sobre qualquer alteração das condições de segurança da barragem que possa implicar acidente ou desastre.
No caso de barragens de rejeitos de mineração, passa a ser obrigatória a elaboração do Plano de Ação Emergencial (PAE), que disciplina todas as ações a serem tomadas em acidentes. Esse plano passa a ser exigido também de barragens com dano potencial associado de nível médio. O dano potencial associado é avaliado segundo o impacto que um possível rompimento ou vazamento pode ocasionar, mesmo que a barragem não tenha a classificação de alto risco.
Mapa de inundação
O PAE deverá ser apresentado à população local antes do início do primeiro enchimento do reservatório da barragem. O empreendedor terá de se articular com os órgãos de proteção e defesa civil municipais e estaduais para sua implementação.
O texto define ainda áreas de maior risco em relação à localização de uma barragem, como a zona de autossalvamento (ZAS), que é aquela abaixo do nível da barragem na qual não há tempo suficiente para socorro; e a zona de segurança secundária (ZSS), que é o trecho não caracterizado como ZAS.
Esses trechos deverão constar do mapa de inundação, com o detalhamento das áreas potencialmente afetadas por uma inundação e os cenários possíveis para facilitar a notificação eficiente e a evacuação da região.
O projeto proíbe a instalação de barragem de mineração se os estudos indicarem que, no caso de ruptura, os rejeitos atingiriam comunidades já localizadas em zona de autossalvamento.
Para barragens atuais nessa situação, o texto determina a descaracterização da estrutura ou o reassentamento da população e o resgate do patrimônio cultural, ou obras de reforço que garantam a estabilidade efetiva da estrutura.
A decisão será do poder público, ouvido o empreendedor, e levando-se em consideração a anterioridade da barragem em relação à ocupação e a viabilidade técnico-financeira das alternativas.
O substitutivo altera a Lei 12.334, de 2010, que institui a Política Nacional de Segurança de Barragens, a Lei 9.433, de 1997, que cria a Política Nacional de Recursos Hídricos, a Lei 7.797, de 1989, que cria o Fundo Nacional do Meio Ambiente (FNMA) e o Decreto-Lei 227, de 1967, que institui o Código de Mineração.
Agência Senado
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