O Flamengo começou 2019 com postura agressiva no mercado de transferências – adotada pela diretoria que tinha acabado de ser empossada com Rodolfo Landim na presidência. Poucos dias separaram, já em janeiro, as contratações de Rodrigo Caio, Bruno Henrique e Arrascaeta, além do empréstimo de Gabigol. Isso sem falar nas aquisições no meio da temporada. O Flamengo foi avassalador em 2019. Em 2020, tudo indica que a história rubro-negra será outra.
O clube publicou, há duas semanas, o orçamento com os números finais para 2019 e os projetados para 2020. E, ao mesmo tempo em que é tentador para o torcedor ficar encantado com grandes cifras, como o faturamento recorde de R$ 857 milhões, faz bem apontar para desafios e riscos que aguardam a direção no ano que está para começar.
O spoiler – se é que dá para resumir tanta informação em uma frase – é que o Flamengo precisará trocar o crescimento avassalador pela consolidação em seu novo patamar. Os troféus foram para a estante, o torcedor aguarda pela nova jornada, mas ficaram contas a pagar. E metas a cumprir para lá de desafiadoras, esportivas e financeiras.
Vamos por partes...
Nos principais números do orçamento do Flamengo para 2020, organizados na tabela abaixo, o torcedor precisa reparar no seguinte.
Caso o torcedor fique curioso, depreciações são ajustes nos valores de ativos. Um tipo de despesa que importa mais para a contabilidade do que para o bolso. A provisão para Crédito de Liquidação Duvidosa (CLD) é o valor que o clube tinha para receber, mas desistiu por ser improvável de realmente receber – leia-se: os calotes levados de patrocinadores e sócios. Contingências são pagamentos de dívidas, e o resultado financeiro geralmente é composto por juros e variações cambiais.
Nada deste último parágrafo é importante para a análise neste caso.
Ok, quais são os riscos?
Dito de uma maneira que não envolva números, a maior ameaça ao Flamengo em 2020 é acreditar que o excelente desempenho esportivo de uma temporada deva se repetir na outra. Expectativa demais pode virar problema. Principalmente porque, após a mudança do cenário para um modelo mais meritocrático, hoje o futebol está mais variável e remunera clubes de acordo com o que acontece no campo.
Isso vale principalmente para a receita com direitos de transmissão. O Campeonato Brasileiro tem uma parcela relevante condicionada à colocação na tabela. Copa do Brasil e Libertadores foram valorizadas e estão inteiramente vinculadas à fase alcançada pelos clubes. Aquilo que o torcedor chama de premiação, por ter como fontes pagadoras as emissoras de televisão, entende-se no orçamento como transmissão.
Para chegar aos R$ 283 milhões orçados em transmissão, o Flamengo precisará alcançar as seguintes colocações ou fases nos campeonatos.
E não é só.
Para cumprir o orçamento em termos de transmissão, a diretoria rubro-negra também precisará convencer CBF e Globo a pagar R$ 5,7 milhões adicionais pela simples presença na Copa do Brasil. Isso está exposto no orçamento em sua terceira página como "pleito pela participação em fases iniciais". Não há garantia de que o argumento será atendido.
A lógica concebida por dirigentes é: o Flamengo não jogará as fases iniciais da Copa do Brasil, porque está classificado automaticamente para as oitavas de final, mas a imagem do clube será usada pela organizadora e pela emissora desde o início do campeonato para engrandecê-lo. Logo, eles acreditam, precisa haver alguma remuneração pela participação.
Outra peculiaridade rubro-negra é que o Campeonato Carioca, apesar de próximo, ainda não teve um desfecho na renegociação dos direitos de transmissão entre Flamengo e Grupo Globo. O clube descreve em seu orçamento que existe a possibilidade de não haver acerto.
Também fazem parte desta conta R$ 12 milhões obtidos por meio da venda das placas estáticas na beira do campo – cifra já assegurada.
Parte relevante do orçamento do Flamengo está ligada a transmissão e desempenho em campo. Caso eventual imprevisto prejudique as projeções, como eliminações precoces ou não recebimento do pleito adicional na Copa do Brasil, é possível que a diretoria compense com a venda dos direitos do Carioca. Mas pode não acontecer. Há risco.
E nas demais receitas?
A maior fonte de arrecadação do Flamengo em 2019 não foi a televisão, e sim as transferências de atletas. Puxadas para cima excepcionalmente pela venda de Paquetá no ano anterior e também por outras negociações ocorridas na temporada, como Léo Duarte e Cuéllar.
Ciente de que não conseguiria repetir quase R$ 300 milhões em vendas, a direção rubro-negra baixou a expectativa no orçamento para 2020 até R$ 80 milhões. Esta é a cifra que precisará ser arrecadada com a venda de alguns jogadores de "meia importância" para o elenco, ou então com um titular muito bem vendido. Dependerá das ofertas que surgirem.
Para compensar a redução nos atletas, todo o resto precisará subir. Patrocínios – inclusive os incentivados por benefício fiscal, pertencentes a esportes olímpicos –, bilheterias e sócio-torcedor contam com reajustes generosos para a temporada que está prestes a começar. Isso para que o Flamengo continue aumentando seus custos e investimentos no futebol. Por isso mesmo 2020 precisa ser um ano de consolidação.
Caso as receitas não subam para bancar todos os custos, existe solução provisória. Graças à credibilidade que ganhou no mercado financeiro, à auditoria externa de uma empresa como a EY, entre outros fatores, o clube carioca hoje dispõe de linhas de crédito para cobrir compromissos.
Com o futebol apresentado nesta temporada, dirigido por Jorge Jesus e grande elenco, o Flamengo tem plenas condições de disputar e ganhar novos títulos em 2020. Mas é necessário ter em mente que, no ano novo, dirigentes ainda terão que pagar pelas dívidas que foram feitas com empréstimos bancários e aquisições de jogadores. Um orçamento com metas esportivas e financeiras tão otimistas é um risco para o domínio rubro-negro que dirigentes e torcida tanto aguardam.
Globo Esporte
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