Já passamos do tempo em que duvidaríamos da capacidade de Messi numa noite chuvosa de terça em Stoke, certo? Nem tanto. A expressão envelheceu com o rebaixamento dos Potters em 2018, mas ainda há entre os mortais quem se sinta capaz de cobrar uma transferência do argentino para a Premier League – sugerindo a necessidade de se “provar fora da zona de conforto”.
Como se se não bastasse tudo o que Messi fez nos últimos 14 anos, a terça-feira nos brindou com nova oportunidade diante de um inglês. Nesta terça, o Barcelona visita o Liverpool no Anfield, carregando enorme vantagem conquistada no jogo de ida da semifinal da Liga dos Campeões, pasmem, um 3 a 0 com dois gols dele (veja a pintura de falta abaixo). Se os catalães balançarem as redes, os Reds estarão obrigados a marcar pelo menos cinco vezes – desfalcados de Salah e Firmino por problemas médicos.
O roteiro já fora parecido nas quartas de final, com dois gols contra o Manchester United no Camp Nou. Messi também enfrentou o semifinalista Tottenham na fase de grupos e, veja só, também fez dois, mas no Wembley. Metade dos 12 gols desta caminhada veio contra alguns dos melhores times da Premier League.
Podemos e devemos ressaltar que o Barcelona também é um timaço. Foi campeão espanhol com três rodadas de antecedência e está na final da Copa do Rei – enfrenta o Valencia no dia 25. Num mundo em que a riqueza está cada vez mais concentrada em poucos clubes, é absolutamente natural Messi estar rodeado de talento. Hoje em dia não há craque que dure em time pequeno. E nem mesmo Pelé esteve mal acompanhado nos anos 60, não é (eu juro que encerro o tema por aqui)?
É fato que jogar na Inglaterra e enfrentar ingleses em competições continentais são circunstâncias diferentes. Mas não imagine que Messi fosse reforçar o Leicester, o Everton ou o Wolverhampton apenas para lhe agradar. Até mesmo boa parte do big-6 (formado por Manchester United, City, Liverpool, Chelsea, Arsenal e Tottenham) não seria capaz de realizar uma contratação desse patamar ou arcar com os salários.
Num desvio de rota não tão absurdo, Messi estaria sendo comandado por Guardiola no Manchester City e marcando os seus 50 gols por temporada de média. Não consigo imaginar nada diferente num time que fez 159 gols até aqui – o Barça tem 133, sendo Messi responsável por 48, fora as assistências.
Este City, aliás, pelo segundo ano consecutivo terminará a Premier League com campanha razoavelmente superior à do Barcelona no Espanhol, onde supostamente encontra maior facilidade em virtude da disparidade financeira. O Liverpool, atual vice-líder, poderá ter a maior pontuação de um segundo colocado das grandes ligas europeias.
Seria questão de tempo para os eternos desconfiados o pedirem noutro lugar. “Haters gonna hate”, diz a famosa expressão em inglês que dificilmente envelhecerá. Numa tradução livre, quem odeia vai seguir odiando. Eles continuarão existindo, ainda que Messi tenha mostrado um rendimento espetacular contra o big-6, geralmente em confrontos decisivos.
Dentre eles, o Arsenal é a maior de suas vítimas, enquanto Tottenham e Liverpool se juntaram ao grupo neste ano. Os 26 gols significam que os ingleses estão para Messi assim como os alemães estão para Cristiano Ronaldo na Liga dos Campeões. Os dois são os carrascos oficiais dos representantes dos respectivos países – na lista do português estão Bayern (9), Borussia Dortmund (7), Schalke (7) e Wolfsburg (3).
Em dezembro, com alguns meses de Juventus, Cristiano Ronaldo entoou o coro para que Messi se juntasse a ele no futebol italiano (onde?):
- Para mim, a vida é um desafio. Gosto disso e de fazer as pessoas felizes. Eu gostaria que ele viesse para a Itália algum dia. Como eu, aceite o desafio. Mas se ele está feliz lá (no Barcelona), eu respeito – disse em entrevista à “Gazzetta dello Sport”.
O ponto a ser discutido é qual tipo de desafio oferece uma liga que tem o mesmo campeão por oito anos seguidos, desfrutando de um sucesso esportivo absoluto no país à medida que rivais mais históricos, como Inter e Milan, ainda patinam para reencontrar o rumo.
Cristiano Ronaldo está realmente provando algo na Itália ou apenas deixou o Real Madrid por desgaste e incompatibilidade com Florentino Pérez, que não quis pagar o que demandava? A pior temporada merengue em 10 anos ajuda a explicar a decisão enquanto o camisa 7 ergueu mais um troféu.
No Barcelona, Messi acabou de atingir o 600º gol (em 683 jogos!). Títulos vieram aos montes: 10 Espanhóis, com talvez a quinta Champions e a sétima Copa do Rei a caminho - além de sete Supercopas da Espanha, três Supercopas da Europa e três Mundiais de Clubes. Em mais de 80% desses torneios houve participação decisiva do camisa 10.
Quando se aposentar, Messi virará estátua no Camp Nou: por que teria de sair? Maldini sofria a mesma cobrança no Milan? Gerrard no Liverpool? Totti na Roma? Giggs no Manchester United? Todos tornaram-se entidades pelos serviços prestados e construíram lindas histórias de fidelidade com início, meio e fim. São um pouco mais do que ídolos e cada vez mais artigos raros no futebol globalizado.
Passaram pelo Barça ao longo da última década Guardiola, Henry, Eto’o, Ibrahimovic, Valdés, Puyol, Fàbregas, Daniel Alves, Xavi, Neymar, Iniesta... E por lá seguem Ter Stegen, Piqué, Alba, Busquets, Rakitic e Suárez. Num esporte coletivo como o futebol ninguém vence sozinho, inclusive Messi. Mas seria possível ganhar tanto sem o melhor jogador da nossa geração? Quem é a zona de conforto de quem?
Globo Esporte
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