O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse nesta quinta-feira (7) que está otimista e não vai desistir do acordo entre o Mercosul e a União Europeia, cujas negociações estão em fase final. No discurso de abertura da cúpula do bloco econômico, no Rio de Janeiro, o petista afirmou que o grupo sul-americano vai continuar tentando finalizar o tratado com os europeus.
"Eu estou muito otimista e eu, sinceramente, tenho como lema não desistir nunca, porque não existe nada que seja impossível a gente concretizar, mesmo essa tentativa de acordo com a União Europeia, [que] está durando 23 anos, mas a gente tem que continuar tentando fazer acordo com a União Europeia", disse Lula.
"Cada um de vocês, quando exercer a presidência, vai exercer com muita vontade de fazer muita coisa, e depois a gente se dá conta de que nem tudo que a gente quer acontece do jeito que a gente quer. Mas um dado concreto é que nós continuamos avançando", declarou.
"Nós herdamos uma versão desse acordo do governo passado. A versão era inaceitável, porque nos tratava como se fôssemos seres inferiores. Eu diria até que nos tratava como se nós fôssemos países colonizados ainda, com falta de respeito, inclusive ameaçando", avaliou Lula.
Na sequência, o presidente contou que se reuniu com o primeiro-ministro da Espanha, Pedro Sánchez, atual presidente da União Europeia, para tratar do acordo. "Depois mudaram aquela [versão], mas não mudaram na questão industrial, ou seja, nós não temos direito de ser um país um pouco desenvolvido."
Lula classificou o atual texto do acordo de mais equilibrado, porém ainda insuficiente. "As resistências da Europa ainda são muito grandes. Eu estranho a falta de flexibilidade deles de entender que nós temos ainda muita coisa para crescer, temos o dever de nos industrializar e que nós só precisamos de flexibilidade, de eles comprarem alguma coisa nossa com maior valor agregado. Mas eles ainda não estão sensíveis para isso", afirmou.
Acordo
Recentemente, o presidente da França, Emmanuel Macron, expressou sua firme oposição ao acordo de livre comércio entre a UE e o Mercosul, por contrariar a defesa da biodiversidade e o combate à mudança climática. Ele disse esperar que o governo de Javier Milei na Argentina se comprometa com ambos os objetivos. "É um acordo que não é bom para ninguém", afirmou o francês.
Uma das questões apresentadas pela União Europeia está relacionada às compras governamentais. O bloco quer que o Mercosul autorize as empresas da Europa a participar, em condição de igualdade, de licitações em países sul-americanos, e vice-versa. Essas compras envolvem a aquisição de bens, a execução de obras e afins.
Na visão do governo brasileiro, a medida pode prejudicar a indústria nacional, uma vez que o Executivo adquire produtos de diversas áreas, como saúde e agricultura. Em uma eventual participação de países europeus nas licitações, o Brasil poderia ter a produção interna prejudicada ou não suficientemente estimulada. A contraproposta pede a revisão de condições estabelecidas para essa categoria.
Há entraves também nas questões ambientais. Os países da Europa querem a garantia de que a intensificação do comércio entre os blocos não vai resultar no aumento de destruição ambiental no Brasil e nas demais nações do Mercosul. Em contrapartida, o lado brasileiro é a favor de que não haja distinção na aplicação de eventuais sanções, ou seja, de que ambos os lados sejam penalizados da mesma forma em caso de descumprimento.
Se concluído, o tratado vai formar uma das maiores áreas de livre comércio do planeta, com quase 720 milhões de pessoas, cerca de 20% da economia global e 31% das exportações mundiais de bens. Se as normas do acordo entre o Mercosul e a União Europeia já valessem em 2022, cerca de R$ 13 bilhões em exportações brasileiras para o bloco teriam sido negociados sem o pagamento de imposto, segundo uma estimativa da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Com o tratado, em torno de 95% de todos os bens industriais terão o imposto de importação para entrar no mercado europeu zerado em até dez anos, sendo que mais da metade desses produtos — quase 3.000 — terá o benefício imediato na entrada em vigor do acordo, diz a confederação.
Outros temas
Durante a abertura da cúpula do Mercosul, Lula falou ainda sobre outros temas. O presidente agradeceu ao presidente do Paraguai pelo trabalho de cooperação entre as polícias federais de ambas as nações, que resultou na apreensão de milhares de armas e prisões.
"Queria te dar os parabéns pelo comportamento da sua Polícia Federal, junto com a PF brasileira e junto também com os americanos, para destruir a maior quadrilha de contrabando de armas que eu tive conhecimento na nossa querida América do Sul", disse Lula.
O presidente brasileiro ressaltou que o país vai realizar a Copa do Mundo de Futebol Feminino, em 2027, e relembrou a derrota do Brasil para a Alemanha na Copa do Mundo de 2014. "Estamos com uma agenda internacional muito grande, e se tudo der certo a gente ainda vai fazer a Copa do Mundo Feminina em 2027. Espero que a gente não passe o vexame da Copa do Mundo em 2014, quando apanhamos de 7 a 1 da Alemanha. Sinceramente, a gente não precisava de maior vergonha."
Por fim, Lula voltou a criticar o Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU) e defendeu reforma na governança global.
"A representação geopolítica da ONU não pode ser a mesma de 1945. É preciso mudar. É preciso mudar inclusive a forma de representação. Eu tenho dito que quem estiver participando do Conselho de Segurança da ONU como membro permanente não representa a si próprio ou o país, tem que representar o continente de que ele participa. É preciso mais trabalho e mais reunião para mais representatividade, porque, se não tivermos isso, não conseguimos colocar em prática nada que nós decidimos na COP", disse.
"Você faz uma COP, maravilhosa, participam centenas de milhares de pessoas, se aprova um monte de documento, ninguém executa. E, no ano seguinte, uma nova COP, no outro ano, uma nova COP. É preciso que, na questão ambiental, a gente tenha decisões que sejam implementadas quase que obrigatoriamente por todos os países, sempre levando em conta que não são os países menores que têm que pagar a conta. Quem tem que pagar a conta são os países industrializados, que há 200 anos poluem o planeta", acrescenta.
R7
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