Novembro 27, 2024

Em carta à Unesco, Lula defende regulação das redes sociais para fortalecer democracia Featured

Em carta lida durante fórum da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (Unesco) nesta quarta-feira (22), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) defendeu a regulação das redes sociais como estratégia para diminuir desigualdades de acesso, disseminação de fake news e fortalecimento da democracia.

Após ressaltar a importância dos avanços tecnológicos e digitais para a comunicação global, Lula pondera que a falta de regulação traz pontos negativos e que precisam ser corrigidos. "O ambiente digital acarretou a concentração de mercado e de poder nas mãos de poucas empresas e países. Trouxe, também, riscos à democracia", afirma.

O presidente citou a disseminação de notícias falsas durante a pandemia de Covid-19 que, segundo ele, "contribuiu para milhares de mortes" e atingiu os setores mais vulneráveis da sociedade. Atribuiu, ainda, os atos extremistas de 8 de janeiro ao "ápice de uma campanha, iniciada muito antes, que usava, como munição, a mentira e a desinformação".

Na carta, que foi lida por um representante brasileiro durante o fórum, Lula afirma que é papel da comunidade internacional trabalhar na regulação das redes sociais, de forma a encontrar um equilíbrio entre a garantia da liberdade de expressão e o direito coletivo a informações confiáveis.

O presidente encerra a mensagem afirmando que o Brasil pode contribuir "para a construção de um ambiente digital mais justo e equilibrado, baseado em estruturas de governança transparentes e democráticas".

Leia a carta na íntegra

A Sua Excelência a Senhora

Audrey Azoulay

Diretora-Geral da Unesco

Gostaria de agradecê-la pelo convite para participar da Conferência Global da UNESCO que será realizada em Paris entre os dias 22 e 23 de fevereiro de 2023.

As plataformas digitais, em suas diferentes modalidades, são parte fundamental de nosso dia-a-dia. Elas definem a maneira como nos comunicamos, como nos relacionamos e como consumimos produtos e serviços. O desenvolvimento da internet trouxe resultados extraordinários para a economia global e para nossas sociedades. As plataformas ajudam a promover e difundir o conhecimento. Facilitam o comércio. Aumentam a produtividade. Ampliam a oferta de serviços e a circulação de informações.

Esses benefícios, no entanto, estão distribuídos de maneira desproporcional entre as pessoas de diferentes níveis de renda, ampliando a desigualdade social. O ambiente digital acarretou a concentração de mercado e de poder nas mãos de poucas empresas e países. Trouxe, também, riscos à democracia. Riscos à convivência civilizada entre as pessoas. Riscos à saúde pública. A disseminação de desinformação durante a pandemia contribuiu para milhares de mortes. Os discursos de ódio fazem vítimas todos os dias. E os mais atingidos são os setores mais vulneráveis de nossas sociedades.

O mundo todo testemunhou o ataque de extremistas às sedes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário do Brasil no último 8 de janeiro. Ao fim do dia, a democracia brasileira venceu e saiu ainda mais forte. Mas nunca deixaremos de nos indignar com as cenas de barbárie daquele domingo.

O que ocorreu naquele dia foi o ápice de uma campanha, iniciada muito antes, que usava, como munição, a mentira e a desinformação. E tinha, como alvos, a democracia e a credibilidade das instituições brasileiras. Em grande medida, essa campanha foi gestada, organizada e difundida por meio das diversas plataformas digitais e aplicativos de mensagens. Repetiu o mesmo método que já tinha gerado atos de violência em outros lugares do mundo. Isso tem que parar.

A comunidade internacional precisa, desde já, trabalhar para dar respostas efetivas a essa questão desafiadora de nosso tempo. Precisamos de equilíbrio. De um lado, é necessário garantir o exercício da liberdade de expressão individual, que é um direito humano fundamental. De outro lado, precisamos assegurar um direito coletivo: o direito de a sociedade receber informações confiáveis, e não a mentira e a desinformação.

Também não podemos permitir que a integridade de nossas democracias seja afetada pelas decisões de alguns poucos atores que hoje controlam as plataformas. A regulação deverá garantir o exercício de direitos individuais e coletivos. Deverá corrigir as distorções de um modelo de negócios que gera lucros explorando os dados pessoais dos usuários. Para ser eficiente, a regulação das plataformas deve ser elaborada com transparência e muita participação social. E no plano internacional deve ser coordenada multilateralmente. O processo lançado na Unesco, tenho certeza, servirá para construção de um diálogo plural e transparente. Um processo que envolva governos, especialistas e sociedade civil.

Ao mesmo tempo, devemos trabalhar para reduzir o fosso digital e promover a autonomia dos países em desenvolvimento nessa área. Precisamos garantir o acesso à internet para todos, fomentar a educação e as habilidades necessárias para uma inserção ativa e consciente de nossos cidadãos no mundo digital. Países em desenvolvimento devem ser capazes de atuar de forma soberana na moderna economia de dados, como agentes e não apenas como exportadores de dados ou consumidores passivos dos conteúdos.

Esta conferência na Unesco é o início de nosso debate, e não seu ponto final. Estou certo de que o Brasil poderá contribuir de forma significativa para a construção de um ambiente digital mais justo e equilibrado, baseado em estruturas de governança transparentes e democráticas.

Aproveito a oportunidade para apresentar os votos de minha mais alta estima e consideração.

R7
Portal Santo André em Foco

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