Após afirmar que o ministro Sergio Moro deveria dar uma “segurada” no pacote anticrime , para não atrapalhar o andamento das reformas econômicas, o presidente Jair Bolsonaro convidou o titular da Justiça para participar de uma transmissão ao vivo e defendeu que o Parlamento “se debruce” sobre o assunto e leve as propostas à votação.
Ao longo da transmissão, Moro defendeu itens do projeto e chegou a corrigir o presidente ao afirmar que não se tratavam de propostas apenas dele, mas do “governo Jair Bolsonaro”. O presidente, em um tom diferente do que havia adotado pela manhã, disse que “gostaria” que a Câmara levasse o assunto adiante.
– A gente gostaria que a Câmara botasse em discussão e votação o pacote anticrime. Moro vai falar da importância e necessidade. A gente espera que isso vá para frente. O sonho dele, ao abrir mão de 22 anos de magistratura, é se aperfeiçoar no combate ao crime organizado, corrupção e lavagem de dinheiro. Tem um projeto dele que está ha seis meses na Câmara, e ele gostaria de falar alguma coisa sobre o projeto e o que nós podemos fazer para que seja votado – disse Bolsonaro.
Em outro momento da transmissão, o presidente afirmou que “é natural” que o Congresso faça mudanças nos projetos que são apresentados. No caso do projeto de Moro, o grupo de trabalho que analisa o tema já fez algumas alterações: os parlamentares negaram a possibilidade de estabelecer a prisão após condenação em segunda instância por uma lei ordinária, sem necessidade de mudança constitucional; o instrumento que previa aos investigados em procedimentos criminais declararem culpa antes da abertura do processo, em acordo com o Ministério Público – chamado de “plea bargain” – também foi rejeitado.
– Outras ideias podem aparecer. Vamos tratar desse assunto (pacote anticrime) com a velocidade e responsabilidade que nós todos devemos ter. Espero que o Parlamento se debruce sobre isso e bote em votação – acrescentou Bolsonaro.
Moro disse que o governo levou ao Congresso “projetos sólidos”, como a reforma da Previdência, para retomar a economia e gerar empregos. O ministro ressaltou, no entanto, que as “pessoas também clamam por mais segurança”. Em seguida, Moro listou itens que estão no pacote anticrime, como a ampliação dos casos classificados na hipótese de excludente de ilicitude.
– O que tem que ser entendido é que pessoas não são máquinas, então, quando alguém é atacado, a pessoa reage e, eventualmente, pode haver até algum excesso. Mas a pessoa praticou excesso em momento de descontrole. Li no Twitter do senhor (Bolsonaro) hoje criticando a possibilidade de um pai que matou a filha deixar presídio por conta da “saidinha”. Isso é algo que projeto anticrime acaba. Tem a execução (da pena) em segunda instância e tem medida importante que diz assim: se você foi condenado por ser membro de crime organizado, você não obtém beneficio prisional, como progressão de pena, enquanto se mantiver vinculado a uma organização criminosa. A gente quer que preso se ressocialize e não volte como soldado do crime organizado. Vamos desestimular que se permaneça faccionado para diminuir a força das facções. São fundamentais as reformas econômicas, mas precisamos tratar também da segurança das pessoas. Com o projeto anticrime, vamos conseguir dar um salto – afirmou Moro.
De manhã, ao sair do Palácio da Alvorada, Bolsonaro havia indicado que o pacote anticrime não era prioridade neste momento:
– Tem que conversar com o Moro, né, teve alguma reação do Parlamento e você não pode causar turbulência. Lamento, mas tem que dar uma segurada. Eu não quero pressionar isso aí (pacote anticrime) e atrapalhar, tumultuar lá (no Congresso). Tantas outras propostas não enviamos para não atrapalhar a Previdência. Quando manda uma proposta para lá, já tem alguns deputados e senadores que passam a ser contra uma proposta minha. É natural, fiquei 28 anos lá dentro. “Olha, se essa proposta for para frente, eu não voto a Previdência”. É o jogo, tem que saber jogar – disse Bolsonaro.
O presidente chegou a dizer que o ministro da Justiça precisaria ser paciente para não atrapalhar atrapalhar outros projetos de interesse do governo:
– Moro está vindo de um meio onde ele decidia com uma caneta na mão. Agora, não temos como decidir de forma unilateral. E temos que governar o Brasil. O que eu sempre falei para todos os ministros? Eu quero que o Brasil dê certo. No que for possível, vamos cuidar de problemas para que deixe de haver problemas daqui para frente. O passado depende da Justiça. Ministro Moro é da Justiça, mas ele não tem poder de… Não julga mais ninguém. Então, temos que… Entendo a angústia dele (Moro) em querer que o projeto dele vá para a frente. Entendo, mas nós temos que diminuir o desemprego, fazer o Brasil andar, abrir o nosso comércio. Sabemos que uma pressão em cima da reforma dele agora atrapalha um pouco a tramitação dessa reforma mãe nossa. Eu tenho falado com ele, (pedindo) um pouco mais de paciência.
Redução da maioridade penal
O presidente também disse que vai pedir ao presidente do Senado, Davi Alcolumbre, para colocar em pauta a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que reduz a maioridade penal de 18 para 16 anos nos casos de crimes graves, como estupro, latrocínio, homicídio doloso e lesão corporal seguida de morte. O texto foi aprovado na Câmara em 2015, mas não avançou no Senado. Sem entrar em detalhes, Moro afirmou que “para crimes graves, cabe a discussão sobre a redução da maioridade penal”.
– Esse apelo que a gente vai fazer ao Davi Alcolumbre e tenho certeza que vai botar (a PEC) em votação no Senado – disse Bolsonaro.
O Globo
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