Três representações protocoladas nesta segunda-feira (10) pedem ao Tribunal de Contas da União (TCU) e ao Ministério Público Federal que investiguem se o governo criou um "orçamento secreto" em troca de apoio parlamentar, segundo apontou o jornal "O Estado de S. Paulo".
De acordo com reportagem do jornal publicada neste domingo (9), o governo federal teria montado um orçamento paralelo de R$ 3 bilhões por meio do qual deputados e senadores aliados indicavam obras públicas e compra de equipamentos em suas bases eleitorais. Parte dos recursos teria sido destinada à compra de tratores e equipamentos agrícolas com valores superfaturados, segundo o jornal.
O Ministério do Desenvolvimento Regional contesta a reportagem e afirma que não há irregularidades (leia mais sobre a manifestação do ministério ao final desta reportagem).
Das três representações, duas são dirigidas ao TCU e uma ao Ministério Público Federal. Ao TCU, recorreram o subprocurador-geral da República Lucas Furtado e o deputado federal Marcelo Freixo (PSOL-RJ). A bancada do PSOL na Câmara fez representação à Procuradoria-Geral da República.
Os deputados e senadores têm direito às chamadas emendas individuais, limitadas a R$ 16,3 milhões por parlamentar — metade vai obrigatoriamente para a saúde. O chamado "orçamento secreto" permitiria que indicassem obras em valores superiores, executadas pelo Ministério do Desenvolvimento Regional e pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), estatal subordinada à pasta.
Na representação que protocolou no TCU, o subprocurador-geral Lucas Rocha Furtado pede a adoção "das medidas necessárias a apurar a notícia de que o Presidente Jair Bolsonaro criou orçamento secreto em troca de apoio parlamentar, promovendo a análise, de maneira urgente e aprofundada, do esquema denunciado pela reportagem do site Estadão, de modo a identificar as fragilidades da metodologia de distribuição de recursos a parlamentares e determinar as alterações necessárias ao procedimento denunciado”.
Segundo Furtado, a verba do orçamento paralelo seria aplicada "à margem de todo o regramento constitucional, legal e regulamentar, em ofensa ao princípio da isonomia que orienta a distribuição de recursos orçamentários entre os parlamentares no regime das emendas individuais e sem a transparência que requer o uso de recursos públicos".
Ele diz, ainda, que os fatos denotam, em tese, "inadequada execução orçamentária, motivada supostamente por interesses políticos", podendo "caracterizar eventual crime de responsabilidade, por atentar contra a lei orçamentária".
Líder da minoria na Câmara, o deputado Marcelo Freixo (PSOL-RJ) enviou uma representação à presidente do TCU, ministra Ana Arraes.
No texto, o deputado pede que a Corte instaure uma auditoria para apurar todas as circunstâncias denunciadas pela reportagem e eventuais responsabilidades.
Na representação, Freixo lembra que os 513 deputados e 81 senadores têm direito a indicar, no máximo, R$ 8 milhões em emendas por ano, além dos R$ 8 milhões que vão necessariamente para a saúde.
"No entanto, os parlamentares que apoiaram os candidatos do governo nas eleições para as presidências das casas do Congresso Nacional conseguiram expandir o poder de direcionar gastos do orçamento”, argumenta.
Ele afirma, ainda, que as possíveis ilegalidades apontadas pela reportagem de "O Estado de S. Paulo" não se deram "apenas no âmbito do desvio de finalidade na utilização de verbas públicas. Há também superfaturamento na compra de produtos agrícolas”.
A bancada do PSOL na Câmara dos Deputados ingressou com representação no Ministério Público Federal (MPF) contra o presidente Jair Bolsonaro, o ministro Rogério Marinho (Desenvolvimento Regional) e o diretor-presidente da Codevasf, Marcelo Pinto.
Os deputados do PSOL argumentam que a reportagem revela um “esquema que atropela leis orçamentárias, regras legais e a Constituição Federal".
"Para além disso, tem o objetivo de dificultar o controle do Tribunal de Contas da União (TCU) e da própria sociedade. Contrariando princípios administrativos consagrados, os acordos para direcionar o dinheiro não são públicos e não têm transparência”, diz a representação.
Ministério contesta
Em nota, o Ministério do Desenvolvimento Regional contesta a reportagem. A pasta afirma que é do Congresso a prerrogativa de indicar recursos da chamada emenda de relator-geral do orçamento. Essas emendas são indicadas no processo orçamentário com o código RP9.
“O RP 9 foi criado por iniciativa do Congresso Nacional em 2019, e não pelo Executivo, como erroneamente tenta afirmar a manchete do jornal. A reportagem teve acesso, por exemplo, aos ofícios de parlamentares da oposição que tiveram indicações contempladas dentro do RP9, mas preferiu omiti-los, divulgando apenas os da base aliada e deste ministério”, diz o ministério.
Sobre o possível superfaturamento, o MDR afirma que a planilha de valores dos equipamentos agrícolas adquiridos, à qual a reportagem teve acesso, foi "elaborada com base em pesquisas de preços realizadas em 2019, é apenas uma referência para a apresentação de propostas e não considera as especificações dos equipamentos, a marca e os itens disponíveis, fatores que podem alterar o custo final”.
G1
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