Uma nova leva de supostas conversas envolvendo o ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, foi divulgada pela revista Veja nesta sexta-feira, 5, e sugere que, quando ainda atuava como juiz federal em Curitiba, ele teria orientado procuradores da Operação Lava Jato a anexar provas para fortalecer a parte acusatória num processo.
Uma troca de mensagens pelo aplicativo Telegram de 28 de abril de 2016, a que a revista teve acesso em parceria com o site The Intercept Brasil, mostraria Deltan Dallagnol, chefe da força-tarefa em Curitiba, avisando à procuradora Laura Tessler que Moro o teria avisado sobre a falta de uma informação na acusação contra um réu acusado de ser um dos principais operadores de propina no esquema de corrupção da Petrobrás. O réu, de acordo com a Veja, era Zwi Skornicki, representante da Keppel Fels, estaleiro que tinha contratos com a estatal.
"No caso do Zwi, Moro disse que tem um depósito em favor do (Eduardo) Musa (ex-funcionário da Petrobrás) e, se for por lapso que não foi incluído, ele disse que vai receber amanhã e dá tempo. Só é bom avisar ele", teria escrito Deltan. "Ih, vou ver", teria escrito a procuradora em resposta. No dia seguinte, de acordo com a revista, o MPF incluiu um comprovante de depósito de US$ 80 mil feito por Skornicki a Musa e Moro, logo depois, aceita a denúncia e cita o documento que havia pedido na decisão.
Moro tem dito que não reconhece a autenticidade das conversas, diz que foi vítima de um ataque ilegal de hackers e nega conduta fora da lei em sua atuação como juiz federal. Em resposta à reportagem, o Ministério da Justiça emitiu uma nota dizendo que Moro não teve conhecimento do conteúdo dos trechos previamente à publicação. A revista afirma que Moro e Deltan se recusaram a receber a reportagem. Veja as notas na íntegra abaixo.
Em evento em São Paulo nesta sexta, 5, Moro reclamou da publicação. "Não apresentaram as mensagens a mim para que eu pudesse avaliar e explicar", disse o ministro, que reiterou não lembrar de mensagens enviadas há anos. "Eu não poderia falar sobre a autenticidade das mensagens, mas posso verificar os fatos", disse.
Eduardo Cunha. O trecho de conversas divulgado pela revista Veja também contém mensagens supostamente enviadas na noite do dia 12 de junho de 2017. Nesta época, o procurador Ronaldo Queiroz teria criado um grupo no aplicativo de mensagens para avisar que foi procurado pelo advogado do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, para iniciar uma negociação de delação premiada.
Queiroz teria afirmado que as revelações poderiam ser de interesse dos procuradores de Curitiba, Rio de Janeiro e Natal, onde corriam ações relacionadas ao político, diz a revista. Pouco menos de um mês depois, Moro teria enviado uma mensagem a Dallagnol questionando a possível delação. "Rumores de delação do Cunha... Espero que não procedam", teria dito o agora ministro. Dallagnol teria respondido que são "só rumores que não procedem", e ainda teria reforçado a Moro que "sempre que quiser, vou te colocando a par". De acordo com a revista, o ex-juiz reforçou que é contra a delação de Cunha e agradeceu se o procurador o mantivesse informado.
"O Fachin é nosso". A reportagem de Veja também mostra um trecho no qual Dallagnol, em 13 de julho de 2015, teria comentado com os colegas do MPF que se encontrou com o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Edson Fachin. "Caros, conversei 45 minutos com o Fachin. Aha, uhu, o Fachin é nosso", teria celebrado o procurador.
Fausto Silva. Em outro trecho das supostas conversas, em 7 de maio de 2016, Moro teria comentado com Dallagnol que havia sido procurado pelo apresentador de televisão Fausto Silva. De acordo com o então juiz, o apresentador teria cumprimentado Moro pelo trabalho na Lava Jato e lhe dado um conselho: "Ele disse que vocês nas entrevistas precisam usar uma linguagem mais simples. Para todo mundo entender. Para o povão. Conselho de quem está há 28 anos na TV".
Procurado pela reportagem de Veja, Fausto Silva confirmou o encontro com Moro e o teor da conversa. /Colaboraram André Ítalo Rocha, Fernanda Guimarães e Francisco Carlos de Assis
Nota de redação da revista Veja
"Procurados por VEJA, Deltan Dallagnol e Sergio Moro não quiseram receber a reportagem. Ambos gostariam que os arquivos fossem enviados a eles de forma virtual, mas, alegando compromissos de agenda, recusaram-se a recebê-los pessoalmente, uma condição estabelecida por VEJA. Mesmo sem saber o conteúdo das mensagens, a assessoria do Ministério da Justiça enviou a seguinte nota: “A revista Veja se recusou a enviar previamente as informações publicadas na reportagem, não sendo possível manifestação a respeito do assunto tratado. Mesmo assim, cabe ressaltar que o ministro da Justiça e Segurança Pública não reconhece a autenticidade de supostas mensagens obtidas por meios criminosos, que podem ter sido adulteradas total ou parcialmente e que configuram violação da privacidade de agentes da lei com o objetivo de anular condenações criminais e impedir novas investigações. Reitera-se que o ministro sempre pautou sua atuação pela legalidade”."
Nota de esclarecimento do Ministério da Justiça
"O ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro, não reconhece a autenticidade de supostas mensagens obtidas por meios criminosos e que podem ter sido adulteradas total ou parcialmente. Lamenta-se que a Revista Veja se recusou a encaminhar cópia das mensagens antes da publicação e tenha condicionado a apresentação das supostas mensagens à concessão de uma entrevista, o que é impróprio. De todo modo, alguns esclarecimentos objetivos:
1 - Acusa a Veja o ministro, então juiz, de quebra de parcialidade por suposta mensagem na qual teria solicitado manifestação urgente do Ministério Público para decidir sobre pedido de revogação de prisão preventiva de José Carlos Bumlai. A prisão preventiva de José Carlos Bumlai foi decretada em 19 de novembro de 2015. Houve pedido de revogação da prisão ao final do mês de dezembro. O recesso Judiciário inicia em 19 de dezembro. Então, a manifestação do Ministério Público era necessária, como é em pedidos da espécie, para decidir o pedido da defesa. A urgência decorre da natureza de pedido da espécie e, no caso em particular, pela proximidade do recesso Judiciário que se iniciaria em 19 de dezembro. Então, a solicitação de urgência, se autêntica a mensagem, teria sido feita em benefício do acusado e não o contrário. Saliente-se que o ministro, como juiz, concedeu, em 18 de março de 2016, a José Carlos Bumlai o benefício de prisão domiciliar para tratamento de saúde, o que foi feito em oposição ao MPF. Os fatos podem ser verificados no processo 5056156-95.2015.4.04.7000 da 13ª Vara Federal de Curitiba.
2 - Acusa a Veja o ministro, então juiz, de quebra de parcialidade por suposta mensagem de terceiros no sentido de que teria solicitado a inclusão de fato e prova em denúncia do MPF contra Zwi Skornicki e Eduardo Musa na ação penal 5013405-59.2016.4.04.7000. Não tem o ministro como confirmar ou responder pelo conteúdo de suposta mensagem entre terceiros. De todo modo, caso a Veja tivesse ouvido o ministro ou checado os fatos saberia que a acusação relativa ao depósito de USD 80 mil, de 7 de novembro de 2011, e que foi incluído no aditamento da denúncia em questão, não foi reconhecido como crime na sentença proferida pelo então juiz em 2 de fevereiro de 2017, sendo ambos absolvidos deste fato (itens 349 e 424, alínea A e D). A absolvição revela por si só a falsidade da afirmação da existência de conluio entre juiz e procuradores ou de quebra de parcialidade, indicando ainda o caráter fraudulento da suposta mensagem.
3 - Acusa a Veja o ministro, então juiz, de ter escondido fatos do ministro Teori Zavascki em informações prestadas na Reclamação 21802 do Supremo Tribunal Federal e impetrado por Flávio David Barra. Esclareça-se que o então juiz prestou informações ao STF em 17 de setembro de 2015, tendo afirmado que naquela data não dispunha de qualquer informação sobre o registro de pagamentos a autoridades com foro privilegiado. Tal afirmação é verdadeira. A reportagem sugere que o então juiz teria mentido por conta de referência a suposta planilha constante em supostas mensagens de terceiros datadas de 23 de outubro de 2015. Não há qualquer elemento que ateste a autenticidade das supostas mensagens ou no sentido de que o então juiz tivesse conhecimento da referida planilha mais de 30 dias antes. Então, é evidente que o referido elemento probatório só foi disponibilizado supervenientemente e, portanto, que o então juiz jamais mentiu ou ocultou fatos do STF neste episódio ou em qualquer outro.
4 - Acusa a Veja o ministro, então juiz, de ter obstaculizado acordo de colaboração do MPF com o ex-deputado Eduardo Cunha. O ocorre que eventual colaboração de Eduardo Cunha, por envolver supostos pagamentos a autoridades de foro privilegiado, jamais tramitou na 13ª Vara de Curitiba ou esteve sob a responsabilidade do ministro, então juiz.
5 - Acusa a Veja que o ministro, então juiz, de ter comandado a Operação Lava Jato por conta de interferência ou definição de datas para operações de cumprimento de mandados de prisão ou busca e apreensão. Ocorre que, quando se discutem datas de operações, trata-se do cumprimento de decisões judiciais já tomadas, sendo necessário que, em grandes investigações, como a Lava Jato, haja planejamento para sua execução, evitando, por exemplo, a sua realização próxima ou no recesso Judiciário.
O ministro da Justiça e da Segurança Publica sempre foi e será um defensor da liberdade de imprensa. Entretanto, repudia-se com veemência a invasão criminosa dos aparelhos celulares de agentes públicos com o objetivo de invalidar condenações por corrupção ou para impedir a continuidade das investigações. Mais uma vez, não se reconhece a autenticidade das supostas mensagens atribuídas ao então juiz. Repudia-se ainda a divulgação distorcida e sensacionalista de supostas mensagens obtidas por meios criminosos e que podem ter sido adulteradas total ou parcialmente, sem que previamente tenha sido garantido direito de resposta dos envolvidos e sem checagem jornalística cuidadosa dos fatos documentados, o que, se tivesse sido feito, demonstraria a inconsistência e a falsidade da matéria. Aliás, a inconsistência das supostas mensagens com os fatos documentados indica a possibilidade de adulteração do conteúdo total ou parcial delas."
Estadão
Portal Santo André em Foco
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