Ministérios afetados pelas reduções previstas no orçamento de 2021 alertaram o governo sobre os impactos dos cortes. Em documentos obtidos pelo GLOBO, as pastas pediram mais recursos e apontam para um possível “apagão” nas pesquisas científicas envolvendo temas como a Covid-19, paralisação de projetos de infraestrutura e até o fechamento de universidades. Na outra ponta, o Ministério da Defesa, com o aval direto do presidente Jair Bolsonaro, conseguiu um aumento de R$ 2,2 bilhões na estimativa orçamentária. Para atender os militares, o governo avalia até adiar o Censo 2020, que seria realizado no ano que vem mas pode ficar para 2022.
O presidente reconheceu ontem existir uma “briga enorme” em torno do Orçamento e disse que “cada vez mais diminui o montante”, ao falar com apoiadores no Palácio da Alvorada. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), por sua vez, sinalizou que haverá resistências no Congresso à proposta em elaboração ao dizer que “não faz sentido nenhum” o ministério da Defesa ter mais recursos que o da Educação.
Dados do chamado “referencial orçamentário” para 2021 mostram que a Educação deve perder 13% no ano que vem, comparado à proposta do governo para 2020, e a Saúde e a Defesa 5%, cada. Com isso, pela primeira vez a pasta das Forças Armadas teria mais recursos que o MEC.
O governo tem até 31 de agosto para enviar ao Congresso o Orçamento, mas não é comum haver alterações bruscas na fase final de elaboração. Diferentes ministérios, porém, tem formalizado reclamações sobre as verbas que lhes estão sendo reservadas e apresentam justificativas para pedir mais recursos.
Diante das pressões, o governo avalia adiar, mais uma vez, a realização pelo IBGE do Censo Demográfico. A coleta de dados estava programada para este ano, foi adiada para 2021 e, agora, pode ser transferida para 2022. O dinheiro destinado ao Censo, cerca de R$ 2,3 bilhões, deve ser direcionado para outros ministérios, especialmente para os militares.
A pesquisa é feita a cada dez anos e tem abrangência nacional. Pesquisadores do órgão visitam os domicílios pelo país para obter dados sobre as características dos moradores — nível de estudo, trabalho, entre outras informações. Para justificar o novo adiamento, o governo deve alegar questões sanitárias devido à pandemia da Covid-19.
O GLOBO teve acesso a pedidos feitos pelos ministérios da Educação, Ciência e Tecnologia, Infraestrutura e da Mulher, Família e Direitos Humanos. Em julho, a estimativa era de que a pasta de Marcos Pontes teria um orçamento de R$ 6,5 bilhões, dos quais apenas R$ 3,1 bilhões seriam para despesas discricionárias, que podem ser manejadas livremente. Em 6 de agosto, a Ciência e Tecnologia enviou um ofício ao Ministério da Economia afirmando que o valor era insuficiente para a manutenção dos projetos em andamento e, assim, pesquisas como as que envolvem a Covid-19 poderiam ser prejudicadas.
“Destacam-se os compromissos no desenvolvimento de projetos de P&D (pesquisa e desenvolvimento) relativos ao enfrentamento da COVID-19, bem como as medidas mitigadoras dos danos causados pela mesma”, diz um trecho do documento.
O ministério pediu mais R$ 1,849 bilhão, sendo R$ 235 milhões para bolsas concedidas pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Em 13 de agosto, a Economia respondeu que só poderia liberar mais R$ 100 milhões e recomendou que estes recursos fossem para o CNPq.
A situação no Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (MMFDH) não foi diferente. A Economia informou que a pasta da ministra Damares Alves teria direito a R$ 248 milhões do Orçamento de 2021, dos quais R$ 189 milhões para despesas discricionárias. O valor, segundo o ministério, é inferior aos R$ 220,4 milhões previstos para este ano, que, na avaliação da ministra, “já se mostrou insatisfatório”. Em ofício no dia 15 de julho, Damares pediu mais R$ 140 milhões ao governo e argumentou que a redução impactaria programas contra violência doméstica e proteção de testemunhas. A pasta, porém, só conseguiu mais R$ 31 milhões.
O MEC conseguiu reverter parte das suas perdas. Em maio, o orçamento estimado era de R$ 97,2 bilhões. Em junho, o então ministro Abraham Weintraub pediu mais R$ 6,9 bilhões e afirmou à equipe econômica que a manutenção do orçamento naquele patamar prejudicaria programas como o que distribui livros didáticos a escolas de todo o país, paralisaria a construção de creches e fecharia universidades federais.
Em julho, a pasta conseguiu mais R$ 4,7 bilhões, valor que ainda é 13% a menos do que o proposto pelo governo para 2020. E na semana passada conseguiu mais um acréscimo, de R$ 1,39 bilhão. O montante, porém, ainda é menor do que o pedido pela pasta.
No caso do Ministério da Defesa, o referencial monetário entregue em julho pelo Ministério da Economia foi de R$ 107,9 bilhões. No dia 11 de agosto, a Defesa enviou um ofício à equipe econômica solicitando um aumento dessa estimativa no valor de R$ 752 milhões. Anteontem, o Ministério da Economia informou que, após consulta ao presidente Jair Bolsonaro, ficou decidido que o referencial orçamentário no orçamento da Defesa cresceria em R$ 2,2 bilhões.
Procurado, o Ministério da Economia não respondeu o que o levou a atender os pleitos dos ministérios de forma diferente. Em nota, disse que o prazo para o governo enviar a proposta ao Congresso é 31 de agosto e que “até essa data, as propostas orçamentárias e as solicitações de expansão de limites demandadas pelos órgãos serão analisadas e submetidas à decisão da Junta de Execução Orçamentária”.
O Globo
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