O procurador-geral da República, Augusto Aras, foi alvo de protestos de subprocuradores-gerais da República no Conselho Superior do Ministério Público Federal nesta sexta-feira, por causa de suas declarações contrárias à Lava-Jato em uma live para advogados, e reagiu com irritação. Rebateu as afirmações, disse ser alvo constante de fake news, afirmou que havia "provas" contra a Lava-Jato e encerrou a sessão, levantando-se imediatamente para ir embora, apesar da tentativa de seus colegas debaterem o assunto.
Composto de dez subprocuradores-gerais da República, o Conselho Superior é o órgão máximo de discussão e deliberação do MPF. Aras participou de uma live para advogados criminalistas na última terça-feira na qual afirmou que a Lava-Jato de Curitiba possuiria "caixas de segredos" e processos ocultos, além de outras acusações, o que gerou diversas manifestações internas de críticas ao procurador-geral.
O subprocurador Nicolao Dino, um dos opositores de Aras no conselho, leu uma carta aberta assinada por mais outros três conselheiros do órgão, na qual afirmaram que as declarações do procurador-geral "alimentam suspeitas e dúvidas" sobre a instituição e geram um MPF "desacreditado, instável e enfraquecido".
— A fala de Vossa Excelência não constrói e em nada contribui para o que denominou de “correção de rumos”. Por isso, não se pode deixar de lamentar o resultado negativo para a Instituição como um todo, expressando, por que não dizer, nossa perplexidade, principalmente por se tratar de graves afirmações articuladas por seu Chefe, que a representa perante a sociedade e os demais órgãos de Estado — afirmou Nicolao Dino.
Ainda na carta, ele afirmou que a independência funcional dos procuradores "é um pilar estruturante" da instituição e que dados das investigações da Lava-Jato só poderiam ser compartilhados com decisões judiciais específicas sobre o motivo do acesso.
— Dados relativos a investigações submetidos a cláusula de sigilo só podem ser compartilhados mediante autorização judicial, com devida motivação e se necessário para outras investigações, e que, portanto, a salvaguarda desse sigilo não se confunde com opacidade ou 'caixa-preta' — disse Nicolao.
Outro conselheiro, José Elaeres, que inclusive faz parte da gestão de Aras, pediu a palavra para criticar a "exposição pública das nossas divergências internas" e pedir ao procurador-geral que os assuntos sobre a Lava-Jato sejam tratados apenas pela Corregedoria, que é o órgão responsável por infrações disciplinares. A subprocuradora Maria Caetana manifestou concordância com o colega.
Ao final, Aras retomou a palavra e reafirmou as acusações que fez à Lava-Jato.
— Não me dirigi em um evento acadêmico de forma se não pautado em fatos e provas. Fatos e provas que se encontram sob investigação da corregedora-geral do MPF e do Conselho Nacional do Ministério Público. Caberá a eles apurar a verdade, a extensão, a profundidade e os autores, e os coautores, e os partícipes, de tudo que declarei. Porque me acostumei a falar com provas, e tenho provas, e essas provas já estão depositadas perante os órgãos competentes — disse o procurador-geral.
Aras acusou seus adversários de atuarem em favor de um "aparelhamento" do MPF e de um "anarcossindicalismo", que ele disse estar combatendo. Disse não ter "receio de desagradar" e que sua missão era "servir ao MPF com a dignidade do cargo".
— Gostei muito de saber que o colega Nicolao Dino foi o porta-voz, o porta-voz de alguns que fazem oposição sistemática a esse procurador-geral da República, de alguns que vivem a plantar fake news e que eu estou colecionando cada fake news com as respectivas respostas, para que ao final da gestão eu apresente cada fake news e cada resposta — discursou.
Em tom cada vez mais irritado, o procurador-geral disse que não deixaria "nenhuma irregularidade, ilicitude, aparelhamento sem resposta". Queixou-se do anonimato de procuradores na realização de críticas à sua gestão e chegou a insinuar que colegas plantaram notícias contra sua família.
— Por isso, doutor Nicolao, rejeito seus conselhos e espero que os órgãos oficiais respondam a Vossa Excelência e aos seus liderados. No mais, fatos e provas estão entregues à Corregedoria do MPF e ao CNMP. Está encerrada a sessão — afirmou Aras, levantando-se para ir embora enquanto outros conselheiros tentavam falar.
Um deles, Nívio de Freitas, chegou a ironizar o abrupto encerramento:
— É o diálogo — disse.
O Globo
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