O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), ministro Dias Toffoli, sugeriu nesta quarta-feira que juízes e integrantes do Ministério Público só possam disputar uma eleição pelo menos oito anos depois de deixarem o cargo. E pediu que o Congresso aprove uma lei nesse sentido. Em resposta, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), prometeu pautar "em breve" a proposta.
Hoje, é preciso esperar seis meses para ser candidato. A proposta em discussão na Câmara só valeria para casos futuros. Assim, caso aprovada, não impediria por exemplo, a eventual candidatura presidencial do ex-juiz Sergio Moro em 2022. Ele deixou o cargo em 2018 para se tornar ministro da Justiça a convite do então presidente eleito Jair Bolsonaro.
Na Câmara dos Deputados, sempre houve apoio de líderes de centro em torno de uma proposta de quarentena para juízes que deixem a carreira para disputar eleições. Além do ex-ministro Sergio Moro, há outros casos de juízes que se popularizaram na esteira das bandeiras de combate à corrupção, como a ex-juíza Selma Arruda, eleita senadora e depois cassada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
— É um assunto que tem que ser analisado com toda a cautela — diz Carlos Sampaio (SP), líder do PSDB na Câmara. — Existe uma preocupação concreta de alguns parlamentares de que se use a carreira como trampolim para uma candidatura e isso deve ser objeto de reflexão. O importante é que qualquer medida seja para frente, e não para trás, para não parecer que é algo direcionado a alguém.
Em sessão do CNJ que discutia o caso de um juiz que participava de "lives" político-partidárias, Toffoli destacou que os juízes tem que observar limites constitucionais, legais e éticos de modo a preservar sua imparcialidade. Ele afirmou que já vem defendendo a ideia de fixar um prazo maior de inelegibilidade há algum tempo.
— Porque assim se evitaria a utilização da magistratura e do poder imparcial do juiz para fazer demagogia, aparecer para a opinião pública e depois se fazer candidato. Quem quer ser candidato, seja como magistrado, seja como membro do Ministério Público, tem que deixar a magistratura, tem que deixar o Ministério Público. E há que haver um período de inelegibilidade, sim — afirmou Toffoli.
Ele demonstrou preocupação com os reflexos de candidaturas de ex-magistrados na respeitabilidade e imparcialidade do Judiciário. E, sem mencionar nomes, disse que há magistrado que, incensado pela imprensa, já pensa em candidatura a presidente:
— A imprensa começa a incensar determinado magistrado e ele já se vê candidato a presidente da República, sem nem conhecer o Brasil, sem nem conhecer seu estado, sem ter ideia do que é a vida pública. Quer ir para a política? Pode ir. Saia da magistratura. E tenha um período de inelegibilidade. E aqui, publicamente, eu volto a pedir ao Congresso Nacional: estabeleçam prazos de inelegibilidade para membros da magistratura e do Ministério Público que deixarem suas carreiras para que não possam, magistrados e membros do Ministério Público, fazer dos seus cargos e das suas altas e nobres funções meios de proselitismo e demagogia.
Provocado a falar sobre o assunto após a fala de Toffoli, Rodrigo Maia afirmou:
— O presidente Toffoli está correto. Já existem projetos tramitando na Casa e essa matéria está sendo amadurecida e está muito perto de se chegar a um entendimento, que as carreiras não podem ser utilizadas como trampolim. A estrutura do Estado não pode ser utilizada como trampolim pessoal — disse Maia.
O presidente da Câmara afirmou que a postura de Toffoli pode acelerar a tramitação da matéria:
— Certamente [vamos pautar em breve]. Muita gente queria votar no primeiro trimestre, mas a pandemia acabou atrasando. Estava na ordem do dia, mas certamente com a posição do presidente do Supremo a pauta é refeita. Nos ajuda a refletir de fato a urgência dessa matéria.
O período proposto por Toffoli também será levado em consideração, segundo Maia. Para ele, "o parlamento deve ouvir" o ministro:
— Acho que essa transição entre uma carreira de Estado e as eleições, ela precisa ter um prazo. O presidente Toffoli conhece a engrenagem do Poder Judiciário muito melhor do que eu. Certamente sabe o impacto, propôs 8 anos. É um prazo longo, são duas legislaturas.
No início do ano, deputados quase votaram uma proposta que limita a prerrogativa de magistrados e integrantes do Ministério Público. De autoria do deputado Fábio Trad (PSD-MS), o projeto cria uma quarentena de seis anos e vale também para o registro de candidaturas de integrantes das Forças Armadas e das Polícias Militares.
A proposta ganhou força após o motim de policiais no Ceará, antes da epidemia do coronavírus chegar ao Brasil. Agora, ganha força após as declarações de Toffoli sobre a magistratura. Trad avalia, no entanto, que o prazo de oito anos é muito longo.
— Acho que oito anos já é uma punição. Até porque temos que lembrar que o prazo da Ficha Limpa é inabilitação é de 8 anos. Então, eu coloquei seis anos — disse Trad.
Ele esclarece que o prazo só valerá para quem se fastar do cargo antes da provação da lei.
— Quando começou o debate se valia para o Moro, ou não valia, eu deixei claro: não retroage. É daqui para a frente. Se o Deltan Dallagnol (procurador da Lava-Jato) quiser, por exemplo, ele pode antes da aprovação da lei pedir a exoneração e se candidatar.
O presidente da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), Eduardo André Brandão, avaliou que o prazo de oito anos é excessivo, mas concordou com um período de inelegibilidade maior do que o que existe atualmente, de seis meses.
— A Ajufe sempre se posicionou contra qualquer proposta para juízes se candidatarem a cargos eletivos. Porém, depois que ele sai da magistratura por aposentadoria ou exoneração, o prazo de oito anos proposto parece exagerado. Lembrando que hoje já existe uma quarentena de três anos para o juiz que deixa o cargo, aposentado ou exonerado, atuar nos tribunais de origem. A Ajufe entende que tem que se buscar um equilíbrio entre o que existe hoje e essa proposta para inelegibilidade dos magistrados — disse Brandão.
O Globo
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