O presidente Lula falou à imprensa nesta quinta-feira (5), em Paris, após se reunir com o presidente da França, Emmanuel Macron.
Ao abrir o discurso, Lula afirmou que Macron o recebeu "com a hospitalidade que somente um grande amigo pode oferecer".
Ao mesmo tempo, cobrou publicamente o apoio da França ao acordo comercial entre Mercosul e União Europeia. Os franceses vêm adotando uma postura protecionista para resguardar seus produtores rurais, o que tem atrasado a implementação do acordo.
"Eu assumirei a presidência do Mercosul no próximo dia 6. Eu quero lhe comunicar que não deixaria a presidência do Mercosul sem concluir o acordo com a União Europeia. Portanto, meu caro, abra o seu coração para a possibilidade de fazer esse acordo com o nosso querido Mercosul", disse.
"Esta é a melhor resposta que nossas regiões podem dar diante do cenário de incertezas criado pelo retorno do unilateralismo e protecionismo tarifário", adicionou.
Lula afirmou que os dados da balança comercial atual mostram que Brasil e França regrediram em relação ao patamar de trocas registrado em 2012 – data da última visita de um presidente brasileiro (Dilma Rousseff, à época) à França.
"Não é possível que os valores registrados em 2024, 9 bilhões de dólares, sejam inferiores aos registrados em 2012. Significa que, no comércio, demos um passo atrás e é preciso agora dar dois passos à frente, como se estivesse dançando um bom bolero latino-americano", disse.
Troca de gentilezas
Questionados sobre o impasse no acordo, Lula e Macron adotaram um tom cordial nas respostas – mas incluíram provocações e convites para rediscutir termos que ainda dividem os dois países em relação ao tema.
O que disse Macron
"Este acordo, neste momento estratégico, é bom para muitos setores, mas comporta um risco para os agricultores europeus."
"Porque a Europa, por princípios que o presidente Lula e seu governo compartilham – a ecologia, reduzir a emissão de CO2, proteger a biodiversidade. Por essas razões, proibimos os nossos agricultores de utilizar esses agrotóxicos, por exemplo. Os países no Mercosul não estão no mesmo nível de regulamentação. Não é uma discrepância de qualidade, mas de regulamentação", afirmou Macron.
"Como eu vou explicar aos agricultores que, no momento em que exijo que respeitem as normas, eu abro o mercado para produtos que não respeitem as normas? Isso é injusto, e não é a visão do presidente Lula. Temos que melhorar, aprimorar o acordo, trabalhar para ter cláusulas salvaguardas e espelho", completou.
O que disse Lula
Em seguida, ao responder à mesma pergunta de um jornalista francês, Lula disse que "não está difícil fazer o acordo" – e que o Brasil quer continuar a importar vinhos e queijos franceses, por exemplo.
"Pode ter no mundo alguém preocupado com o meio ambiente igual ao meu governo, mas não tem ninguém melhor. Pode ter alguém com uma ministra que apanha todo dia da imprensa por tentar cuidar do nosso país, mas não tem melhor que a nossa Marina."
"O que não pode é um bloqueio. Vamos colocar as nossas cooperativas para conversar com as cooperativas francesas."
"Não queremos voltar ao protecionismo. Nos anos 1980, me convenceram que era preciso ter livre comércio e globalização, eu era contra. Aí depois que o Brasil entra, os que propuseram não querem mais? Por que nós ficamos competitivos? Isso não vale", disse Lula.
"Eu deixarei a presidência do Mercosul com o acordo União Europeia-Mercosul firmado, com o companheiro Macron participando da assinatura para que seja uma boa fotografia", afirmou.
"Se precisar, eu venho conversar com os agricultores franceses para mostrar que eles vão ganhar com o acordo. [...] É preciso saber quem é que não quer o acordo", completou o presidente.
Outros temas
Ao longo do discurso, Lula exaltou as parcerias de Brasil e França em temas como a proteção ambiental e a produção de aeronaves e submarinos.
"Como vizinhos que compartilham extensa fronteira amazônica, apostamos nos benefícios da integração. É importante, presidente Macron, que o povo francês saiba que a maior fronteira da França com qualquer outro país não se dá na Europa, se dá com a América do Sul e com o Brasil. A França deveria ter orgulho de dizer que a maior fronteira dela é no território amazônico", disse Lula.
O brasileiro também citou os esforços conjuntos Brasil-França na produção de helicópteros – que, segundo Lula, podem reforçar a atuação das polícias no combate ao crime organizado.
"Estamos discutindo uma nova encomenda de aeronaves, porque o governo brasileiro precisa combater de forma muito eficaz o narcotráfico. Precisa combater com mais eficácia o garimpo ilegal, os madeireiros ilegais e tudo que for ilícito no nosso país", afirmou.
"Um território como o Brasil, que tem as florestas que nós temos, não pode se dar ao luxo de não ter os helicópteros necessários para que a gente faça o nosso trabalho bem feito", emendou.
No discurso, Lula também retomou temas que vêm marcando sua participação em fóruns multilaterais e em visitas oficiais de Estado – como o pedido de maiores aportes dos países ricos para financiar ações contra as mudanças climáticas, a crítica às guerras em Gaza e na Ucrânia e a defesa de uma reforma da Organização das Nações Unidas (ONU).
"Não é possível destruir coisas que foram construídas com muita força depois da Segunda Guerra Mundial e tentar voltar ao protecionismo, ao unilateralismo e à fraqueza da democracia que estamos vivendo hoje no mundo. É impressionante o crescimento do negacionismo, do radicalismo de extrema direita", disse.
A agenda de Lula na França também inclui uma reunião com a prefeita de Paris, Anne Hidalgo, e um encontro com a comunidade brasileira.
Durante a visita à França, o presidente ainda participará da Conferência das Nações Unidas sobre os Oceanos, em Nice, e visitará a Interpol em Lyon. A Interpol é atualmente comandada pelo brasileiro Valdecy Urquiza, delegado da Polícia Federal.
"A organização é chave nos esforços multilaterais para o enfrentamento a ilícitos transnacionais, em especial o narcotráfico e a exploração de crianças e adolescentes", disse Lula.
Macron cita Amazônia, guerras e Haiti
Macron destacou que a crise climática preocupa – e reafirmou que estará em Belém para a COP 30.
Segundo o presidente francês, antes da conferência, é possível reunir líderes africanos para tentar alinhar posições que serão apresentadas na COP.
Macron lembrou que a França também tem território coberto pela Floresta Amazônica (Guiana Francesa) e falou sobre a importância de preservar esse ecossistema.
O presidente francês ainda citou que discutiu com Lula crises pelo mundo, como a guerra na Ucrânia, no Oriente Médio e a situação do Haiti.
Macron também defendeu intensificar a relação comercial entre Brasil e França. "Temos uma relação que queremos intensificar mais ainda", disse.
g1
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