Às vésperas da eleição para os comandos da Câmara e do Senado, o presidente Jair Bolsonaro começa a sinalizar os projetos que gostaria de ver pautados no próximo biênio no Congresso. Os próximos presidentes das duas Casas serão responsáveis pela definição do que será colocado em votação na segunda e última metade do mandato do chefe do Executivo, o que desperta interesse com olhos em uma possível reeleição em 2022.
Bolsonaro aposta em temas sensíveis à sua base “raiz”. Projetos como a excludente de ilicitude, a regularização fundiária na Amazônia, a regulamentação da educação domiciliar no Brasil, o voto impresso, mudanças na legislação de improbidade administrativa e a conhecida “agenda de costumes” foram mencionados nos últimos dias tanto em conversas com eventuais postulantes, quanto externadas em pronunciamentos públicos.
Especialistas afirmam que, com essa agenda, Bolsonaro aposta em manter parcela do núcleo duro que o apoiou em 2018, diante de uma possível queda de popularidade nos próximos meses com o fim do auxílio emergencial, em meio a uma economia com inflação em alta, renda comprometida e mais de 14 milhões de desempregados.
— Dado que o liberalismo na figura do (Paulo) Guedes e o combate à corrupção com (Sergio) Moro foram erodidos, sobrou (para Bolsonaro) aquilo que lhe é confortável (pautas mais sensíveis ao bolsonarismo) — afirma Rodrigo Prando, cientista político da Universidade Presbiteriana Mackenzie. — Serão dois anos de confrontação e dois anos em busca de reeleição.
Em 2019 pautas econômicas tiveram prioridade, com a aprovação, por exemplo, da Reforma da Previdência, enquanto este ano a pandemia de Covid-19 dominou o plenário.
Em entrevista na última semana, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), um dos principais obstáculos para o avanço dessa agenda, disse que debater essa pauta no Legislativo é uma forma de fortalecer a candidatura de Bolsonaro à reeleição.
— Ele não ter a pauta de costumes na Câmara reduz esse ambiente polarizado, que construiu a outra eleição dele e vai construir a próxima. Ele não ter ambiente de debate na Câmara sobre armas, de costumes, sobre aborto, diminui o debate na sociedade sobre a pauta (em) que ele quer construir a eleição dele —disse Maia em café de fim de ano com jornalistas.
Em alguns casos, o governo articula apoiar medidas que foram propostas por deputados e senadores. Em outros, acelerar a tramitação de textos enviados pelo próprio Executivo ou reenviar a matéria. Na lista, há projetos que agradam até mesmo a oposição.
Convergência
Na última quinta-feira, durante visita a Porto Seguro (BA), Bolsonaro defendeu a revisão da Lei de Improbidade Administrativa, considerada por especialistas uma das mais importantes legislações para assegurar a moralidade no serviço público. A agenda agrada parte dos integrantes do centrão e até mesmo do PT.
Em setembro, o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), chegou a se aliar ao deputado de oposição Carlos Zarattini (PT-SP) para defender um projeto que abranda a legislação. A proposta foi debatida em comissão especial, mas ainda não houve votação do mérito.
Há outros, no entanto, que membros da esquerda, que serão fiéis da balança para a eleição na s duas Casa, se posicionam de modo contrário. O projeto da excludente de ilicitude, por exemplo, integrava o pacote anticrime enviado pelo então ministro da Justiça, Sergio Moro, ao Congresso em 2019, mas foi retirado de pauta por um grupo de trabalho da Câmara. A proposta livrava de punição agentes de segurança responsáveis por mortes ou atos violentos durante ação policial.
Outro tema que ganha força é o voto impresso. Nas últimas semanas, após a eleição municipal, o assunto vem ganhando força na base mais ideológica do presidente nas redes sociais sob a argumentação de que o sistema eletrônico seria suscetível a fraudes. Não há provas de tais acusações.
Uma Proposta de Emenda à Constituição, apresentada em setembro 2019 pela deputada bolsonarista Bia Kicis (PSL-DF), está parada na Comissão de Constituição de Justiça da Câmara. O texto estima que a impressão de um comprovante após o voto eletrônico custaria cerca de R$ 2,5 bilhões ao longo de dez anos.
Em setembro deste ano, o plenário do Supremo Tribunal Federal decidiu, de forma unânime, pela inconstitucionalidade do voto impresso.
As pautas do presidente
Excludente de ilicitude
Livra de punição agentes de segurança responsáveis por mortes ou atos violentos durante ação policial. Fazia parte do pacote anticrime do ex-ministro Sergio Moro, mas foi rejeitado pela Câmara.
Regularização fundiária na Amazônia
O presidente Jair Bolsonaro quer reapresentar medida provisória que perdeu a validade por não ter sido votada pelo Congresso dentro do prazo. O texto previa que a regularização poderia ser feita em lotes ocupados até 2014 e, em alguns casos, até 2018, o que foi visto por movimentos ambientalistas como uma espécie de “anistia” e incentivo à grilagem de terras.
Educação domiciliar
O “homeschooling” não tem regulamentação no país e é uma demanda de grupos religiosos que consideram a escola inadequada. É uma das metas não cumpridas dos primeiros cem dias da gestão Bolsonaro.
Voto impresso
Bolsonaro defende a impressão de um comprovante após o voto eletrônico, sob o argumento de que o sistema atual seria suscetível a fraudes. Não há provas de tais acusações.
Revisão da Lei de Improbidade Administrativa
A ideia é diminuir seu alcance e eliminar a forma “culposa” — sem intenção — do ato. A lei é considerada importante para assegurar a moralidade no serviço público.
O Globo
Portal Santo André em Foco
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