No Sertão da Paraíba, uma padaria criada por uma associação de mulheres na zona rural de Pombal tem o sol como a grande fonte de abastecimento de energia, complementando a renda de 13 famílias que vivem da agricultura na região. Já a dez quilômetros de Teixeira, uma fábrica de polpas também é beneficiada pela energia solar, o que causa uma economia de até R$ 1.000 mensais, que é revertida em melhorias para a própria comunidade.
Com um dos maiores índices de radiação solar no Brasil, a Paraíba tem a capacidade de atingir anualmente uma produção de mais de 2.200 kWh/m² no setor oeste do estado. O potencial, que tem chamado a atenção de grandes investidores para criação de parques energéticos, também tem feito a diferença no dia a dia de sertanejos que usam a energia solar para aumentar a rentabilidade de pequenos negócios.
A padaria Bolo das Oliveiras, por exemplo, em Pombal, produz pães e bolos, que são vendidos para os moradores dos próprios sítios do entorno e, também, para quatro escolas estaduais, por meio de convênios. O uso da energia solar faz a diferença nos custos da produção e, consequentemente, no lucro alcançado pelo negócio.
"Se fosse com energia comercial, a gente teria um gasto em torno de R$ 1.500. Com a energia solar, a média que a gente paga é de R$ 130. Como aqui a gente trabalha com máquinas muito pesadas, se a gente não tivesse energia solar não teria condições de se sustentar", conta Maria Solange de Oliveira, vice-presidente da associação das agricultoras familiares de Várzea Comprida dos Olivedos.
Segundo ela, a produção começou de forma individual; depois, elas se reuniram na cozinha da sede da associação de agricultores. Como o negócio foi dando certo, elas viram, então, a necessidade de uma melhoria. "A gente precisava de uma cozinha adequada, um certificado de vigilância", diz.
"Reunimos as mulheres e resolvemos ter um local para que a gente pudesse trabalhar coletivamente", conta Maria Solange.
Dois anos após o início das atividades, conseguiram o espaço próprio para a padaria por meio do apoio de órgãos municipais e estatais e do Comitê de Energia Renovável do Semiárido, o Cersa. "Fizemos o projeto, participamos de um edital e fomos contemplados. Na época, foram R$ 30 mil - R$ 20 mil para implementar as placas solares e R$ 10 mil para promover cursos que capacitassem a comunidade e dar o apoio caso o equipamento desse algum problema", diz.
Comitê defende modelo descentralizado
O Comitê de Energia Renovável do Semiárido (Cersa) é um coletivo que conta com o apoio de entidades nacionais e internacionais e que tem como objetivo estimular a implantação do modelo descentralizado de energias renováveis, como a solar e a eólica. No caso da energia solar, estimulam, por exemplo, que cada telhado seja um sistema fotovoltaico, aproveitando os espaços já ocupados.
"Nós auxiliamos as comunidades a captar recursos por meio de editais não só para que elas recebam os equipamentos, mas também para que façam parte da discussão", explica César Nóbrega, coordenador do Cersa e membro da Coordenação Nacional da Frente por uma Nova Política Energética para o Brasil.
"O que a gente tenta é quebrar a barreira de que o debate sobre energia é um debate só de especialista. Na verdade, é uma discussão interdisciplinar", diz César.
Segundo ele, mais de 45 sistemas fotovoltaicos já foram instalados em comunidades com o auxílio do Comitê. "São inúmeras experiências comunitárias em que a gente consegue implantar a economia solidária solar", pontua.
Segundo ele, mesmo a energia solar deve ter seus impactos analisados, para que possam ser vistos possíveis danos ambientais como o desmatamento da caatinga. "Não existe energia limpa, o que existe é energia cujos danos sejam minimizados", alerta César Nóbrega.
Valor economizado na conta de energia vai para melhorias na comunidade
A dez quilômetros de Teixeira, também no Sertão da Paraíba, mulheres da comunidade Poços de Baixo também têm conseguido aumentar sua renda graças à instalação da energia solar em uma unidade de beneficiamento de polpas de fruta. São 20 mulheres envolvidas diretamente na produção que atualmente chega a 2.500 quilos de polpa por mês.
Embora a associação tenha sido fundada em 1999, a instalação das placas solares só foi possível em agosto de 2020, possibilitando um maior rendimento no trabalho desenvolvido.
"Antes, a nossa energia não comportava nossos equipamentos e aí a gente tinha que ficar revezando. Um dia a gente ligava a câmara fria, e no dia seguinte a gente desligava a câmara pra ligar os freezers", conta Vânia Alves, presidente da Associação Comunitária dos Pequenos Produtores Rurais de Poços.
Com uma economia média de R$ 1.000 mensalmente na conta de energia, a comunidade criou um fundo rotativo solidário, que beneficia famílias da própria comunidade, através da construção de cisternas, empréstimos familiares e melhorias habitacionais.
"Hoje, estamos nos organizando para ampliar nossas placas para que a gente consiga zerar nossa conta de energia", conta Vânia.
Consciência ambiental
O empreendedor Pablo Tavares, que mora em Sousa, colocou a energia solar para poder ter mais liberdade dentro de caso no uso de eletrodomésticos como ventiladores e ar-condicionados. Hoje, além de uma economia brutal na conta de energia, ele ainda distribui o excedente de energia gerada em seu telhado para a casa da sua sogra e para a concessionária de motos da qual é proprietário.
"Antes, eu gastava em torno de R$ 600, R$ 700 de energia por mês. Hoje, não passa de R$ 100", conta.
Além de economizar, o uso da energia solar também trouxe uma consciência ambiental para Pablo, coisa para a qual ele só se atentou após ver os números no painel de controle disponível no seu celular.
De acordo com o painel, em dois anos, o uso de energia solar em sua residência já reduziu o desmatamento de 1.498 árvores, economizou mais de 10 toneladas de carvão padrão e reduziu em mais de 10 toneladas a produção de gás carbônico, principal poluente responsável pelo efeito estufa.
"Até então eu não pensava [na questão do meio ambiente]. Mas no meu aplicativo ele diz quantas árvores a gente deixou de cortar, por exemplo, e isso abre a cabeça da gente para o quanto o nosso dia a dia impacta o meio ambiente", relata.
Atlas solarimétrico da Paraíba
De acordo com o Atlas Solarimétrico da Paraíba, lançado no final de 2023, o Sertão é a região que tem o maior nível de radiação do estado. A ferramenta interativa identifica as regiões mais promissoras da fonte de energia solar, por meio de busca e seleção no mapa georreferenciado.
g1 PB
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