Cruz nossa de cada dia
A cruz é assunto difícil de se falar. Mais difícil é aceitá-la, e pesada demais para carregá-la. Num encontro informal de amigos, depois de terem participado da celebração da Sexta-Feira Santa, abriu-se um diálogo interessante. Inclusive comentava-se o sermão do Padre. Um amigo dizia para o outro: “Eu tenho dificuldade de pensar e de ouvir falar da cruz, mas acho que preciso me acostumar, porque não dá para pensar e falar de Cristo, sem cruz”. Outro afirmava: “Eu detesto a cruz e não a aceito de jeito nenhum!” Um terceiro, muito calmo, dizia: “Eu também não lido fácil com a cruz, mas preciso aceitá-la porque sem ela não consigo viver minha fé”.
Cruz é assunto para não se falar em qualquer lugar e nem de qualquer modo. Neste bate-papo dos amigos, há verdades muito sábias. O primeiro desabafo revela um caminho de conversão. “Preciso me acostumar!” Esta não parece ser uma atitude passiva de um acomodado na fé. Este amigo, como tanta gente, gostaria de seguir um Cristo fácil e festivo, elegante e light, mas a sua sinceridade de fé não lhe permite. Ele sabe que sem o Crucificado, não existiria o Ressuscitado. Então sua fé seria vã. Tantos deuses sem cruz já foram inventados na história!
O segundo amigo confessou que detestava a cruz e não a aceitava de jeito nenhum, e ponto final. Então surge a pergunta: como pode uma pessoa assim participar de uma cerimônia de Sexta-Feira Santa? Quem o conhecia melhor, sabia que ele era um bom cristão, mas não admitia a cruz imposta a ele e a tanta gente. Cruz imposta não se pode aceitar! São tantas cruzes que pesam demais nos ombros dos pobres, desprezados e excluídos; são as cruzes insuportáveis das crianças abandonadas e dos jovens que se veem aprisionados pela droga; são as cruzes que se multiplicam nas periferias sociais e existenciais. Foi por estas e tantas outras que o Cristo foi crucificado para garantir a possibilidade de redenção.
O terceiro amigo se faz, um pouco, representante de todos nós que nos dizemos cristãos. Sabemos de nossa tendência natural de fugir da cruz e adorar apenas o Ressuscitado. Porém, este Ressuscitado nos disse: “Se alguém quiser seguir-me, tome a sua cruz, cada dia, e siga-me!” (Mc 8,34).
Nós somos discípulos da Cruz proposta e não imposta. Esta cruz tem um nome que se chama: “AMOR”. Até mesmo, porque não existe amor sem cruz e nem cruz libertadora sem amor. Acolher a cruz proposta não é masoquismo, mas sabedoria e dignidade: “Se o grão de trigo não cai na terra e não morre, não poderá produzir frutos” (Jo 12,24).
A proposta da cruz traz consigo a lógica da vida nova. Só há certeza que a chama se acende, quando há uma vela que se doa. Só há um filho que nasce, quando há uma mãe que se dispõe para o parto. Só há um dia que amanhece quando uma noite chega e se dispõe a passar. É assim: “Quem quiser guardar a vida para si, perde-a e quem a doa por amor, garante-a” (cf. Mc 8,35). Bem-vinda a Cruz nossa de cada dia!
Frei Luiz Turra
Pesquisa: Arimatéa Porto
COMECE O DIA FELIZ
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