Março 30, 2025

Imposto de Renda: proposta do governo pode causar mais distorções do que benefícios, diz estudo

A proposta do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de reforma do Imposto de Renda "parte de um objetivo compreensível de promover mais justiça fiscal", mas "apresenta uma série de problemas que podem causar mais distorções do que benefícios".

A avaliação consta em estudo do Centro de Liderança Pública (CLP), uma organização suprapartidária que discute questões centrais do país. O documento é assinado por Daniel Duque, da Inteligência Técnica da entidade.

Para o CLP, é preciso "repensar a proposta, buscando alternativas que efetivamente tornem a tributação mais justa e progressiva, sem onerar em demasia a produção nem criar saltos bruscos na carga de Imposto de Renda para determinadas faixas de rendimento".

  • Na semana passada, o governo federal propôs ampliar a faixa de isenção do Imposto de Renda, a partir de 2026, de R$ 2.824 para R$ 5 mil. Com isso, cerca de 10 milhões de contribuintes deixariam de pagar IR.
  • Além de ampliar a faixa de isenção para quem ganha até R$ 5 mil por mês, a equipe econômica também propôs uma isenção parcial para valores entre R$ 5 mil e R$ 7 mil por mês.
  • Para compensar a perda de arrecadação com a ampliação da faixa de isenção do Imposto de Renda para rendimentos até R$ 5 mil mensais, o governo pretende taxar os super ricos, ou seja, aqueles com renda mensal superior a R$ 50 mil — o equivalente a R$ 600 mil por ano.

Peso dos impostos sobre a renda
A equipe econômica informou que a proposta do governo visa manter o atual patamar da carga tributária sobre a renda no Brasil, ou seja, não busca reduzi-la e nem elevá-la.

A tributação sobre as rendas, principalmente as mais elevadas, é uma forma de tentar conferir progressividade ao sistema tributário, ou seja, dar um peso maior à tributação de quem ganha mais. Essa é considerada uma forma mais justa de tributação.

No Brasil, dados da Receita Federal (abaixo) mostram que o país tributa menos a renda que outros países. E a proposta do governo Lula não altera o peso dessa tributação.

Já a reforma tributária sobre o consumo, realizada nos últimos anos e praticamente concluída, embora simplifique o ambiente de negócios e impulsione a economia, manteve o Brasil entre os países com maior peso dos impostos sobre consumo na arrecadação.

A consequência da concentração maior da carga tributária brasileira sobre o consumo no Brasil é o alto grau de "regressividade" (se arrecada proporcionalmente mais de quem ganha menos).

"Apesar de o objetivo de aliviar a carga tributária para as faixas de renda mais baixas ser louvável, é preciso considerar o contexto mais amplo do sistema tributário brasileiro. O País já se destaca de forma negativa por depender menos do Imposto de Renda do que outras nações, e, para compensar essa lacuna, acaba recorrendo a alíquotas elevadas em tributos sobre a folha de pagamentos e o consumo", diz o estudo do CLP.

  • A entidade avaliou, ainda, que os impostos sobre salários, considerados elevados no Brasil, "aumentam os custos para a contratação formal, reduzindo a competitividade das empresas e, em muitos casos, empurrando trabalhadores para a informalidade".
  • E que, enquanto o Brasil cobra menos Imposto de Renda em relação a outros países, onera desproporcionalmente o consumo e a contratação de mão de obra.

Durante debate na Frente Parlamentar do Empreendedorismo (FPE) nesta semana, o secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, Marcos Pinto, admitiu que a proposta de reforma da Renda do governo ainda tem de avançar na questão da progressividade, ou seja, em reduzir o peso dos impostos sobre os mais pobres.

"A gente ainda precisa chegar na discussão da progressividade no Brasil, a gente está na discussão da equidade ainda. A gente tem, infelizmente, uma parcela muito pequena da população que paga menos imposto que a grande maioria dos brasileiros, e a gente precisa corrigir isso", disse Marcos Pinto, do Ministério da Fazenda, nesta semana.

Quem será beneficiado?
O estudo da CLP também observa que "uma parcela considerável da população brasileira de renda mais baixa já não paga, ou paga muito pouco, Imposto de Renda".

De acordo com números do IBGE, com base em empregos formais e informais na economia, quase 70% dos trabalhadores já ganham até dois salários mínimos no Brasil, ou seja, já são beneficiados pela isenção do IR pelas regras atuais.

Com isso, somente 32% dos trabalhadores brasileiros, justamente aqueles com maior renda no país, seriam beneficiados pela ampliação da faixa de isenção do IR para R$ 5 mil, e por uma tributação menor entre R$ 5 e R$ 7 mil.

"Nesse contexto, ampliar ainda mais essa isenção pode aprofundar o desequilíbrio na arrecadação de um tributo que, em muitos lugares do mundo, é fundamental para a progressividade do sistema. Nesse sentido, embora se justifique reduzir a carga para quem efetivamente ganha menos, a escolha de expandir a isenção no IR acaba por reforçar uma distorção histórica do sistema tributário brasileiro", avalia a CLP, no estudo.
Segundo o documento, seria mais interessante discutir a redução de impostos que pesam mais sobre as camadas de renda mais baixa, como a possibilidade de diminuir a alíquota-base do futuro Imposto sobre o consumo brasileiro, que tende a ser uma das maiores do mundo.

"Outra alternativa seria aliviar os tributos sobre a folha de pagamentos, estimulando assim a formalização de empregos e o crescimento econômico. Usar o Imposto de Renda como instrumento para promover isenção aos mais pobres agrava a distorção de o Brasil depender pouco desse tributo em comparação a outros países, quando o ideal seria utilizá-lo como uma ferramenta de progressividade mais equilibrada, acompanhada de reformas em outras esferas da tributação", acrescenta a entidade.

Bitributação
Segundo análise do CLP, a compensação da ampliação da faixa da isenção do IR com tributação de rendas acima de R$ 50 mil por mês (R$ 600 mil por ano) levanta a questão de bitributação, pois, no Brasil, parte relevante do lucro das empresas já é tributada previamente por meio da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL).

Atualmente, segundo o CLP, a CSLL corresponde a cerca de 7% da receita federal, patamar alinhado a outros países, de modo que o acréscimo de um novo tributo sobre dividendos, sem qualquer compensação na CSLL, agrava a carga tributária sobre a mesma base de incidência.

Para o secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda, Marcos Pinto, a melhor maneira de analisar a justiça é a tributação efetiva, com alíquotas nominais, combinada das pessoas físicas e jurídicas.

E, segundo ele, estudo do IPEA diz que tributação combinada pra quem ganha mais de R$ 1 milhão no Brasil é de cerca 13% no Brasil, abaixo dos EUA, que é de 30%. "Não estamos falando de um país socialista", declarou.

g1
Portal Santo André em Foco

Rate this item
(0 votes)

Leave a comment

Make sure you enter all the required information, indicated by an asterisk (*). HTML code is not allowed.

© 2019 Portal Santo André em Foco - Todos os Direitos Reservados.

Please publish modules in offcanvas position.