Outubro 03, 2024

CCJ da Câmara dá aval a PEC que anistia partidos por prestação de conta irregular e descumprimento de cota para mulheres e negros

A Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) da Câmara, por 45 votos a 10, deu aval nesta terça-feira (16) a uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que anistia partidos que descumpriram as cotas de recursos para mulheres e negros nas últimas eleições e que impede que a Justiça Eleitoral puna as legendas que cometeram irregularidades nas prestações de contas.

A proposta foi protocolada no dia 22 de março e contou com a assinatura de 184 deputados de diferentes espectros políticos e líderes de oito siglas na Câmara – PL, Republicanos, PSDB, PSB, PDT, PSD, Avante e Podemos –, além dos líderes do governo, José Guimarães (PT-CE), e da oposição, Carlos Jordy (PL-RJ).

Em abril do ano passado, o Congresso já havia promulgado uma emenda constitucional para liberar de punição as siglas que não cumpriram as cotas para mulheres e negros em eleições anteriores. A redação da emenda era clara: a anistia valeria apenas para pleitos anteriores à promulgação – ou seja, até as eleições de 2020.

Para especialistas, a anistia irrestrita aos partidos é prejudicial à democracia e dificulta, ainda mais, a participação de mulheres e negros na política. Além disso, praticamente impede o trabalho de fiscalização por parte da Justiça Eleitoral.

A análise na CCJ da Câmara trata apenas da admissibilidade do texto – ou seja, verifica se ele atende aos requisitos legais e regimentais, mas não discute o mérito da proposta. Após essa fase, o texto ainda precisará ser analisado em uma comissão especial, que discutirá seu mérito.

O que diz a proposta
A proposta tem três pontos principais:

Posterga perdão para descumprimento de cotas: posterga para 2022 o prazo para que as siglas sejam punidas por descumprirem valores mínimos para candidaturas de mulheres e negros nas eleições. O prazo atualmente previsto para anistia é até as eleições de 2018

Prestações irregulares: livra os partidos de qualquer punição por irregularidades nas prestações de contas antes da data da promulgação da PEC

Dinheiro de empresas: permite que os partidos arrecadem recursos de empresas para quitar dívidas com fornecedores contraídas até agosto de 2015

Primeiro signatário da proposta, o deputado Paulo Magalhães (PSD-BA) justificou que a alteração é necessária para esclarecer um "entendimento divergente" que poderia surgir com a emenda promulgada no ano passado.

Para ele, como em 2022 era ano eleitoral, deveria prevalecer o princípio da anualidade, ou seja, qualquer mudança nas regras eleitorais precisa ser aprovada um ano antes da eleição, para que entre em vigor.

Magalhães argumenta que muitas legendas tiveram dificuldade em se ajustar às regras.

Ao defender a constitucionalidade do texto, o relator da matéria, deputado Diego Coronel (PSD-BA), também defendeu que a PEC "reforça núcleo essencial do processo eleitoral brasileiro: a anualidade eleitoral".

Manifestações
Contrário ao texto, o deputado Tarcísio Motta (PSOL-RJ) disse que a PEC é "vergonhosa". "Ela [A PEC] é vergonhosa porque anistia todas as eleições anteriores, todos os problemas nas prestações de contas dos partidos", disse.

"Onde já se viu nós, legisladores, vamos agora para a quarta anistia aos nossos próprios partidos? Quinta anistia, sei lá. Estamos perdendo as contas de tantas anistias que estamos aprovando para nós mesmos. Isso é vergonhoso. Que cada partido conteste as multas, que se defenda, mas se ao final for condenado, pague as multas. Sem anistia."

A favor da PEC, a deputada e presidente do PT Gleisi Hoffman (PR) defendeu que a proposta é uma oportunidade de colocar na Constituição a cota para candidatos negros - que, hoje, é definida apenas por decisões do STF. O tema, contudo, não é tratado na proposta. Segundo Gleisi, o PT irá apresentar essa sugestões durante a tramitação na comissão especial.

Gleisi alegou ainda que as multas determinadas pela Justiça Eleitoral são "abusivas". "As multas e retenções que são colocadas pelo TSE são abusivas e vêm para inviabilizar os partidos políticos. Uma multa não pode ser abusiva, tem que aplicar a punição e tem que ser pedagógica para não acontecer de novo", declarou.

Críticas
A advogada especialista em direito eleitoral e cofundadora da entidade "Quero você Eleita" Gabriela Rollemberg avalia que a proposta subverte o conceito de anualidade eleitoral e que o tema é um retrocesso para a participação das mulheres e negros na política.

"Temos mais de uma década de anistias partidárias. Enquanto não levarmos a sério a necessidade de eleger mulheres e negros neste país, não alcançaremos a diversidade da sociedade brasileira. Não há democracia sem autenticidade", afirmou.
O diretor-executivo da Transparência Partidária, Marcelo Issa, critica uma anistia "ampla, geral e irrestrita".

"É uma anistia global, que sinaliza em sentido oposto ao fortalecimento da democracia brasileira. Isso porque os partidos são o coração da nossa democracia e precisam ser fortalecidos com instituições transparentes, íntegras e democráticas. Quando patrocinam anistias pelo descumprimento de regras aprovadas pelo próprio sistema político do qual são a principal engrenagem, sinalizam para todo o restante da sociedade que a lei não é para todos e que pode ser casuisticamente modificada pelos que detêm o poder", avalia.

Se aprovada, a PEC também permitirá que os partidos arrecadem recursos de empresas para quitar dívidas com fornecedores contraídas até agosto de 2015. Naquele ano, o STF declarou inconstitucional as doações de empresas para campanhas eleitorais.

Como funcionam as cotas
No caso das regras para as mulheres, o Supremo Tribunal Federal (STF) entendeu, em 2018, que os partidos devem reservar, pelo menos, 30% dos fundos eleitoral e partidário para as candidatas – mesma proporção mínima de candidatas mulheres que as siglas devem inscrever em cada eleição.

Na mesma ocasião, a Corte derrubou um teto, estabelecido pelo Congresso em 2015, de 15% nos recursos para as campanhas de mulheres.

Além de anistiar os partidos, a emenda promulgada no ano passado inseriu na Constituição o entendimento do STF de que os partidos devem destinar, ao menos, 30% dos fundos para as campanhas eleitorais femininas, respeitando a proporção de candidatas. A medida também vale para propaganda em rádio e TV.

A emenda do ano passado também inclui na Constituição a obrigatoriedade de as siglas aplicarem pelo menos 5% do fundo partidário na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política das mulheres.

Em 2020, o STF determinou ainda que, já a partir das eleições de 2020, deveria valer a reserva de verba e de tempo de propaganda de forma proporcional entre candidatos brancos e negros.

g1
Portal Santo André em Foco

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