Outubro 02, 2024

Aposentados venezuelanos protestam em Natal adiantado: 'Não temos dinheiro nem para comprar leite'

A advogada venezuelana Urimare Capote, de 62 anos, diz se perguntar diariamente: "quem consegue viver com 3,50 dólares?", que corresponde a R$ 19. Esse é o valor da aposentadoria que ela recebe todo mês. A quantia segue inalterada há dois anos e é insuficiente em um país onde a cesta básica supera os 500 dólares, quase R$ 3 mil.

Diante da situação, dezenas de aposentados se concentraram em frente à sede da Organização das Nações Unidas (ONU) na Venezuela para pedir que o órgão intervenha junto ao governo do presidente Nicolás Maduro, que decretou o início da temporada natalina para a terça-feira (1º).

"O Natal acabou há alguns anos", afirmou Capote à Agência France-Presse (AFP). Ela é representante do Comitê de Defesa de dos Aposentados e Pensionistas na Venezuela.

"É uma chacota miserável do presidente com a gente", disse Eduardo Martínez, professor de 71 anos. "Não temos dinheiro nem para comprar leite, e vamos ter para comprar coisas para as festas natalinas?", questionou o aposentado

A aposentadoria na Venezuela é de 130 bolívares desde 2022. Naquele momento, equivalia a 30 dólares. Hoje, são 3,50 dólares (R$ 19) frente a uma cesta básica que está em 539 dólares (R$ 2,93 mil), segundo estimativas.

Maduro insiste que a precariedade dos salários é consequência das sanções dos Estados Unidos contra o país, enquanto analistas a atribuem a anos de medidas econômicas erradas que destruíram a moeda local em meio a uma profunda recessão.

O presidente foi proclamado reeleito em julho para um terceiro mandato consecutivo de seis anos, apesar das denúncias de fraude por parte da oposição e do não reconhecimento por parte dos Estados Unidos, da União Europeia e de vários países da América Latina.

Antecipação do Natal
Os protestos contra a reeleição resultaram em 27 mortos, quase 200 feridos e mais de 2,4 mil detidos, incluindo menores de idade. Neste contexto, Maduro decretou o início do Natal para 1º de outubro. Na segunda-feira (30), disse em seu programa semanal que a temporada se estenderá até 15 de janeiro.

Comércios em Caracas, capital do país, já iniciaram a venda de enfeites, árvores, luzes e presépios. Em alguns, a nova mercadoria se mistura à do Halloween, uma festa que muitos venezuelanos adotaram e que se tornou popular.

Centros comerciais estão iluminados e as praças decoradas, incluindo a pulsante Praça Bolívar.

Um pinheiro artificial custa mais de 100 dólares (R$ 545) e pode chegar a 900 (R$ 4,9 mil). A hallaca, prato estrela das ceias natalinas, também exige um investimento alto, entre carne de boi, frango, porco, azeitonas, alcaparras e outros temperos.

"Não estou totalmente de acordo", mas "é preciso ter espírito natalino, principalmente pelas crianças", afirmou Deilyn Peña, que estava com o filho de 5 anos em uma praça no bairro comercial Las Mercedes.

"Não me sinto nada, nada conectada", expressa Valeria Ponce, instrutora de ginástica de 22 anos. "Sinto que é uma forma de nos distrairmos um pouco do que está acontecendo e simplesmente nos dar um motivo para celebrar."

Ela evita, como a maioria dos venezuelanos, referir-se diretamente à situação política do país, em meio a um pânico generalizado de acabar preso por dizer algo que possa incomodar o governo.

'Extermínio de aposentados'
Os aposentados presentes ao protesto falavam em "extermínio" e "genocídio" com a renda que recebem. Eles reclamam sobre o destino da arrecadação de um tributo especial para melhorar as aposentadorias que foi aprovado em maio pelo Parlamento.

"Onde estão esses recursos? Quem os auditou?", questionou Capote.

"Os idosos estão vivendo um dos piores momentos da história. Estão abandonados não só pelo Estado, mas também por suas famílias que tiveram que sair da Venezuela", explicou, referindo-se aos quase 8 milhões de venezuelanos que, segundo a ONU, migraram em meio à brutal crise econômica.

Neste cenário, falar de Natal é difícil. "No Natal, a família está unida, e a família venezuelana está totalmente desfeita, espalhada pelo mundo", lamentou Capote.

"Enquanto não houver salário digno, não pode haver um Natal digno", insiste Arturo Morgado, de 68 anos e aposentado. "No ano passado não celebrei, e hoje está tudo pior."

g1
Portal Santo André em Foco

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