Outubro 03, 2024

Pacote anticrime: PGR vê riscos ao combate à corrupção e pede vetos a Bolsonaro

A Procuradoria-Geral da República (PGR) encaminhará nesta terça-feira uma nota técnica sugerindo vetos ao pacote anticrime aprovado pelo Senado na semana passada e que aguarda a sanção do presidente da República, Jair Bolsonaro. Na nota, os procuradores sugerem vetos a 14 pontos do projeto com foco nas atribuições do chamado juiz de garantias e em medidas que, na avaliação do Ministério Público Federal, enfraqueceriam mecanismos de combate à corrupção e ao crime do colarinho branco.

De acordo com o projeto, o juiz de garantias seria diferente do juiz responsável por julgar os casos. Ele ficaria responsável apenas pela condução das investigações. A ideia é que haja mais imparcialidade nas decisões e que o mesmo juiz que atue nas investigações não seja o mesmo que vá sentenciar os réus ao final do processo. A figura, existente em outros países, foi introduzida ao pacote pelos parlamentares após críticas à atuação de Moro na condução da Operação Lava-Jato no Paraná, quando ele era juiz federal.

Na avaliação dos procuradores, o juiz de garantias representa uma inovação ao sistema acusatório atualmente vigente no Brasil. Mesmo assim, a nota pede apenas o veto a algumas atribuições dadas a esses magistrados. Entre elas está a possibilidade de que ele possa determinar, de ofício, o trancamento de inquérito policial se ele entender que não há fundamento para a sua instauração. A medida é entendida como ameaça ao papel do Ministério Público, que pela Constituição Federal, é o titular exclusivo de ações penais.

A nota pede ainda o veto ao dispositivo que prevê que cabe ao juiz de garantias decidir pela sobre requerimentos para acessar informações sigilosas. Os procuradores afirmam que, como decidido recentemente pelo Supremo Tribunal Federal (STF), informações fiscais ou financeiras sigilosas não precisam de autorização do Judiciário para serem compartilhadas com órgãos de investigação como o Ministério Público.

Fragilização da colaboração premiada
Outro ponto do projeto atacado pela nota da PGR é o que determina que pessoas que estejam firmando acordos de colaboração premiada só podem relatar crimes relacionados aos fatos previamente investigados. Na prática, isso faria com que o colaborador em um caso que apura desvios em uma estatal não poderia revelar casos em outra companhia.

Para os procuradores, esse dispositivo poderia enfraquecer o instituto da colaboração premiada. A argumentação é de que parte do sucesso de operações como a Lava Jato se deu, justamente, porque os colaboradores revelaram casos que, inicialmente, não estavam no escopo da investigação inicial.

“Uma das principais razões dos expressivos resultados de grandes operações foi a possibilidade de realizar acordos de colaboração premiada que levaram a descoberta de vários crimes sem relação com os fatos inicialmente investigados, os quais foram, posteriormente, desmembrados e encaminhados aos juízos competentes”, diz um trecho da nota.

Em outro trecho, a nota do PGR pede o veto do dispositivo que altera as regras para a decretação de uma prisão preventiva. A lei aprovada prevê a prisão preventiva pode ser decretada quando houver “indício suficiente de autoria e perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado”. Em outras palavras: quando houver evidências de que a liberdade da pessoa gera uma situação de perigo.

Os procuradores afirmam que essa redação pode facilitar a fuga de pessoas investigadas e ainda poderia facilitar a vida de criminosos do colarinho branco, isso porque nem sempre ficaria evidente que a liberdade de um investigado por corrupção representaria perigo à sociedade.

“A exigência de demonstração do perigo gerado pelo estado de liberdade inviabilizará a prisão para evitar a simples fuga do investigado ou réu, já que a fuga, por si só, não implica em perigo, embora frustre a aplicação da lei penal, gerando impunidade. Ademais, esta previsão tende a restringir a prisão preventiva aos casos de crimes violentos, inviabilizando a prisão do colarinho branco, cujo crime pode ser extremamente danoso, porém sua periculosidade nem sempre é enxergada como tal”, diz um trecho da nota.

A nota também pede o veto de um inciso que proíbe magistrados de proferirem sentenças ou acórdãos caso eles tenham tomado conhecimento de provas consideradas inadmissíveis judicialmente.

Na avaliação do MPF, esse dispositivo poderia inviabilizar o trabalho dos magistrados em situações em que uma prova considerada inadmissível vier a ser veiculada por redes sociais ou outros meios de comunicação.

O pacote anticrime foi uma das principais bandeiras do primeiro ano da gestão de Sergio Moro no Ministério da Justiça. Após uma tramitação tumultuada, o projeto acabou aprovado no final deste ano com uma série de alterações em relação ao texto original. A nota da PGR deverá ser entregue a Bolsonaro na tarde desta terça-feira.

O Globo
Portal Santo André em Foco

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