Setembro 30, 2024

STF vai retomar julgamento sobre prisão em segunda instância na próxima quarta-feira Featured

O Supremo Tribunal Federal (STF) começou nesta quinta-feira a julgar a legalidade das prisões após condenação em segunda instância, com possibilidade de rever o entendimento adotado em 2016 e que autoriza o início da execução da pena antes do trânsito em julgado. Hoje, o relator, o ministro Marco Aurélio, abriu a sessão com a leitura do relatório, seguido das manifestações dos advogados dos autores das ações. O julgamento será retomado na quarta-feira com a manifestação de mais duas entidades da sociedade civil e os pronunciamentos da Procuradoria Geral da República (PGR) e da Advocacia Geral da União (AGU). Depois deles, o relator e os demais ministros anunciam o voto.

A tendência, segundo ministros ouvidos pelo GLOBO, é o plenário permitir que os condenados fiquem em liberdade por mais tempo, enquanto recorrem da sentença. Se a tendência for confirmada, a decisão vai beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-ministro José Dirceu e outros 13 condenados em segunda instância na Lava-Jato que poderão ser libertados.

O presidente do Supremo, Dias Toffoli, iniciou a sessão esclarecendo que o julgamento sobre prisões de condenados em segunda instância não se refere a um réu específico, mas terá consequência para todo o sistema de Justiça do país .

— As ações definirão o alcance da norma constitucional e o entendimento que aqui emanará, independentemente de sua conclusão, servirá de norte para todos os magistrados do país e de todos os sistema de Justiça. Que fique bem claro que as presentes ações e o presente julgamento não se referem a nenhuma situação particular. Estamos diante de ações abstratas de controle de constitucionalidade. O objetivo é, dada a provocação que vem, porque o Judiciário não age de maneira própria, de ofício, dar o alcance efetivo e a interpretação a uma das garantias individuais previstas na nossa Constituição Federal — disse Toffoli, concluindo:

— Esse entendimento se estenderá a todos os cidadãos brasileiros sujeitos à sua eventual aplicação, sem distinção.

Em seguida, o ministro Marco Aurélio Mello leu seu relatório sobre o caso. Ele citou a decisão do presidente do STF, ministro Dias Toffoli, que, em dezembro do ano passado, suspendeu uma decisão do próprio Marco Aurélio que determinava a liberdade de condenados em segunda instância que ainda tinham recursos para serem analisados. Disse que Toffoli agiu de acordo com o regimento, uma vez que as decisões foram tomadas durante o recesso do Judiciário, quando o presidente trabalha em regime de plantão e os demais ministros deixam de despachar. Mas reclamou.

— Abro aqui um parêntese, aditando o relatório já distribuído. É inconcebível visão totalitária e autoritária no Supremo. Os integrantes ombreiam têm acima apenas o colegiado. O presidente é apenas coordenador, e não superior hierárquicos dos pares. Coordena, simplesmente coordena os trabalhos do colegiado. Fora isso é desconhecer a ordem jurídica, a Constituição Federal, as leis e o regimento interno, enfraquecendo a instituição, afastando a legitimidade das decisões que profira. Tempos estranhos em que verificada até mesmo a autofagia. Aonde vamos parar? — questionou Marco Aurélio, dizendo em seguida fazer justiça a Toffoli, que agiu regimentalmente.

No começo, ele brincou com o boato, já desmentido, de que teria ido ao hospital. Na verdade, ele apenas passou mal, foi ao serviço médico do STF e logo depois já estava bem.

— Ao fim, ressuscitado. Hoje pela manhã me disseram que estaria no hospital entubado e que já teriam chamado o padre para a extrema unção — disse Marco Aurélio, provocando risos.

Em seguida, começaram as sustentações orais. Os três primeiros advogados a se manifestarem no plenário tiveram, juntos, 15 minutos para representar o Patriota, partido autor da ação sobre as prisões de condenados em segunda instância. Em defesa da tese, o advogado Heracles Marconi Góes da Silva começou citando a Bíblia e lembrando o slogan da campanha do presidente Jair Bolsonaro: “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos”.

— Não sou teórico do Big Bang, não sou terrivelmente evangélico, mas sou evangélico. Peço licença a todos, porque o Estado é laico, para dizer que temos novos ares, o Brasil passou por um processo eleitoral muito concorrido — afirmou.

O advogado citou os julgamentos do mensalão, que resultaram na prisão dos condenados pelo STF. Também lembrou, sem citar nomes, que na Lava-Jato “alguém foi condenado e serve de paradigma para uma reflexão”.

— Tratamos aqui de uma ação objetiva, mas sabemos que os jurisdicionados são seres humanos, são pessoas que precisam ter uma resposta satisfatória desta corte — concluiu.

Em segunda, outros dois advogados do partido também fizeram sustentação oral. Lucio Adolfo da Silva se limitou a prestar homenagem à legenda, que possibilitou a discussão no STF. Marcos Vinícius Carvalho pediu que Deus iluminasse os corações dos ministros. Antes disso, deixou no plenário uma indagação:

— Se houver flexibilização da segunda instância, não vai haver também flexibilização da Lei da Ficha Limpa? Isso é algo que devemos refletir.

OAB E PCdoB defendem trânsito em julgado
O representante da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Juliano Breda, defendeu a execução da pena somente após o trânsito em julgado, quando não houver mais recursos possíveis. A OAB é a autora de uma das três ações.

— O entendimento da Ordem dos Advogados do Brasil é no sentido de reafirmação da Constituição da República, é no sentido da reafirmação da independência e da liberdade do Poder Legislativo.Entende a Ordem dos Advogados do Brasil que, em nome da força normativa da Constituição, em home da afirmação histórica das garantias individuais, a ação deve ser declarada procedente — disse Breda, que ainda afirmou:

— Falou-se que durante 20 anos o Supremo permitiu a execução antecipada da pena. Esse argumento é parcialmente verdadeiro, porque diz única e exclusivamente a penas privativas de liberdade.

Em nome do PCdoB, partidos autor de uma das ações em julgamento, os advogados Fabio Tofic e José Eduardo Cardozo defenderam que um réu possa aguardar em liberdade até que sejam examinados todos os recursos judiciais possíveis.

— O Brasil é um dos que mais prende preventivamente. Isso vai continuar acontecendo. O que não pode haver é uma decisão carimbo, uma decisão automática de prisão. Uma corte constitucional não pode ceder a essa ânsia de luxuria dessa amante chamada opinião pública — disse Tofic.

Cardozo ressaltou que o trânsito em julgado antes da prisão está expresso na Constituição Federal – e, por isso, a regra não pode ser ignorada. Ele lembrou que, nos cinco anos que foi ministro da Justiça, assistiu a horrores em prisões brasileiras. E que as prisões de condenados em segunda instância contribuem para o aumento da superlotação dos presídios.

— O principal problema do sentimento de impunidade está no nosso sistema prisional. O crime é comandado dali. As pessoas entram pequenos delinquentes e saem integrantes de organizações criminosas. Nós queremos ampliar isso, para ampliar a violência? Não é prendendo dessa forma que nós resolveremos o problema — disse Cardozo.

Além dos advogados dos autores das ações, também foi dada a oportunidade de outros interessados exporem seus argumentos. O primeiro deles foi o advogado criminalista Antônio Carlos de Almeida Castro, o Kakay, que tem como clientes vários políticos importantes. Ele, que é contrário à prisão após condenação em segunda instância, falou em nome do Instituto de Garantias Penais (IGP). Kakay negou que a ação seja uma reação à Lava-Jato ou tenha por objetivo garantir a liberdade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.

— Quanto entramos com a ação, em 16, Lula não era sequer, sequer investigado. Quando julgamos a liminar, Lula não era sequer absolutamente denunciado. Somente em 2018 houve a condenação. São falácias — disse Kakay.

Kakay era inicialmente advogado do PEN, partido autor de uma das ações. Mas o PEN o destituiu da função quando negociava o ingresso do então deputado federal Jair Bolsonaro na sigla. Bolsonaro acabou se filiando ao PSL, partido pelo qual se elegeu presidente. Kakay disse que essa foi a única vez em 40 anos de advocacia em que foi destituído, mas destacou que essa destituição foi uma honra para ele, por demonstrar que está do lado certo.

A votação dos onze ministros só vai começar na sessão seguinte, marcada para quarta-feira da semana que vem – que começa às 9h30 e deve se estender até o fim da tarde. A expectativa é de que a votação comece e termine no mesmo dia, colocando um ponto final na questão.

O Globo
Portal Santo André em Foco

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