A carta pela democracia e em defesa do sistema eleitoral brasileiro gestada na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), é lida nesta quinta-feira (11), no Largo São Francisco, na capital paulista. O documento conta com quase 1 milhão de assinaturas, entre elas a de empresários, banqueiros, acadêmicos e artistas.
O documento não faz menção ao presidente da República, Jair Bolsonaro (PL), mas afirma que o Brasil está "passando por momento de imenso perigo" para a normalidade democrática, com riscos às instituições e insinuações de desacato ao resultado das eleições.
A carta chega em meio às críticas feitas por Bolsonaro ao sistema eleitoral e às urnas eletrônicas. Recentemente, o presidente convocou embaixadores estrangeiros para levantar suspeitas contra o modelo adotado, sem apresentar provas, o que provocou reações em diversos segmentos da sociedade.
A leitura do documento se deu no Pátio das Arcadas, no Largo São Francisco — próximo de lugares históricos, como a Praça da Sé, palco das Diretas Já, em 1984.
O movimento se deu em duas partes: na primeira, às 10h, foi lido o documento "Em Defesa da Democracia e da Justiça", organizado por mais de cem entidades. A segunda, por sua vez, ocorreu a partir das 11h, com a leitura da "Carta às Brasileiras e aos Brasileiros — Estado Democrático de Direito Sempre".
O documento desta quinta-feira reedita o manifesto "Carta aos Brasileiros", lido em 8 de agosto de 1977 pelo professor Goffredo da Silva Telles Júnior, também no Largo São Francisco. Na época, a carta se tornou um marco na luta pelo restabelecimento do Estado democrático de Direito e uma das maiores manifestações da sociedade civil contra o regime autoritário.
Confira a carta na íntegra:
"Em agosto de 1977, em meio às comemorações do sesquicentenário de fundação dos Cursos Jurídicos no País, o professor Goffredo da Silva Telles Junior, mestre de todos nós, no território livre do Largo de São Francisco, leu a Carta aos Brasileiros, na qual denunciava a ilegitimidade do então governo militar e o estado de exceção em que vivíamos. Conclamava também o restabelecimento do estado de direito e a convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte.
A semente plantada rendeu frutos. O Brasil superou a ditadura militar. A Assembleia Nacional Constituinte resgatou a legitimidade de nossas instituições, restabelecendo o estado democrático de direito com a prevalência do respeito aos direitos fundamentais.
Temos os poderes da República, o Executivo, o Legislativo e o Judiciário, todos independentes, autônomos e com o compromisso de respeitar e zelar pela observância do pacto maior, a Constituição Federal.
Sob o manto da Constituição Federal de 1988, prestes a completar seu 34º aniversário, passamos por eleições livres e periódicas, nas quais o debate político sobre os projetos para o País sempre foi democrático, cabendo a decisão final à soberania popular.
A lição de Goffredo está estampada em nossa Constituição "Todo poder emana do povo, que o exerce por meio de seus representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição".
Nossas eleições com o processo eletrônico de apuração têm servido de exemplo no mundo. Tivemos várias alternâncias de poder com respeito aos resultados das urnas e transição republicana de governo. As urnas eletrônicas revelaram-se seguras e confiáveis, assim como a Justiça Eleitoral.
Nossa democracia cresceu e amadureceu, mas muito ainda há de ser feito. Vivemos em um País de profundas desigualdades sociais, com carências em serviços públicos essenciais, como saúde, educação, habitação e segurança pública. Temos muito a caminhar no desenvolvimento das nossas potencialidades econômicas de forma sustentável. O Estado apresenta-se ineficiente diante dos seus inúmeros desafios. Pleitos por maior respeito e igualdade de condições em matéria de raça, gênero e orientação sexual ainda estão longe de ser atendidos com a devida plenitude.
Nos próximos dias, em meio a estes desafios, teremos o início da campanha eleitoral para a renovação dos mandatos dos legislativos e executivos estaduais e federais. Neste momento, deveríamos ter o ápice da democracia com a disputa entre os vários projetos políticos visando a convencer o eleitorado da melhor proposta para os rumos do país nos próximos anos.
Ao invés de uma festa cívica, estamos passando por momento de imenso perigo para a normalidade democrática, risco às instituições da República e insinuações de desacato ao resultado das eleições.
Ataques infundados e desacompanhados de provas questionam a lisura do processo eleitoral e o estado democrático de direito tão duramente conquistado pela sociedade brasileira. São intoleráveis as ameaças aos demais poderes e setores da sociedade civil e a incitação à violência e à ruptura da ordem constitucional.
Assistimos recentemente a desvarios autoritários que puseram em risco a secular democracia norte-americana. Lá as tentativas de desestabilizar a democracia e a confiança do povo na lisura das eleições não tiveram êxito. Aqui, também não terão.
Nossa consciência cívica é muito maior do que imaginam os adversários da democracia. Sabemos deixar de lado divergências menores em prol de algo muito maior, a defesa da ordem democrática.
Imbuídos do espírito cívico que lastreou a Carta aos Brasileiros de 1977 e reunidos no mesmo território livre do Largo de São Francisco, independentemente da preferência eleitoral ou partidária de cada um, clamamos as brasileiras e brasileiros a ficarem alertas na defesa da democracia e do respeito ao resultado das eleições.
No Brasil atual não há mais espaço para retrocessos autoritários. Ditadura e tortura pertencem ao passado. A solução dos imensos desafios da sociedade brasileira passa necessariamente pelo respeito ao resultado das eleições.
Em vigília cívica contra as tentativas de rupturas, bradamos de forma uníssona:
Estado Democrático de Direito Sempre!!!!"
UnB
A Universidade de Brasília (UnB) reforçou o esquema de segurança no campus Darcy Ribeiro em função dos protestos previstos durante o ato em defesa da democracia marcado para esta quinta-feira (11). A Polícia Militar e vigilantes da Faculdade de Direitoforam acionados para ficar de prontidão no estacionamento da unidade, onde ocorre a manifestção.
O movimento integra uma mobilização nacional de faculdades de Direito em todo o país para a leitura da Carta às Brasileiras e aos Brasileiros em Defesa do Estado Democrático de Direito elaborada por professores e alunos da Universidade de São Paulo (USP). Às 15h, manifestantes devem marchar até o Congresso Nacional.
R7
Portal Santo André em Foco
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