Outubro 04, 2024

PGR afirma que proibição do uso de escutas para embasar acusações viola a Constituição Featured

Procuradoria-Geral da República (PGR) afirmou ao Supremo Tribunal Federal nesta quarta-feira (26) que a mudança na legislação que limitou o uso de escutas ambientais – conversas gravadas – eem processos judiciais fere a Constituição Federal.

A medida, incluída pelo Congresso no pacote anticrime, proíbe que esse recurso de gravação seja usado pela acusação em um processo penal – mas autoriza o uso do mesmo recurso pela defesa dos réus.

O parecer da PGR foi apresentado no âmbito de uma ação do partido Rede Sustentabilidade, que acionou o tribunal em abril de 2021 contra essa regra diferenciada para os recursos da acusação e da defesa.

No documento, o procurador-geral Augusto Aras afirma que a medida "tem potencial de geral impunidade de ofensores".

"Invalidar gravações ambientais ou desprezá-las quando verificada integridade das provas, apenas por serem usadas pela acusação e não pela defesa, mostra-se incompatível com o princípio da igualdade, inviabiliza a paridade de armas no contexto do processo penal e tem o potencial de gerar a impunidade de ofensores para cuja resposta estatal é imperiosa", diz Aras.

"Desse modo, o emprego da captação ambiental realizada por um dos interlocutores, tanto em matéria de defesa quanto com vistas à elucidação criminosa por parte da acusação, comprovada a justa causa e a higidez do material, é medida que promove o interesse público e a persecução penal justa", completa.

O PGR ressaltou ainda que este tipo de captação de informações pode ser usado para o combate a crimes cometidos contra vulneráveis.

"Especialmente em contexto de vulnerabilidade, a captação de imagens e sons pela vítima também merece ênfase. Estupro de vulnerável, maus-tratos a idosos, violência doméstica e familiar contra a mulher são condutas criminosas que ocorrem às escondidas. Não são crimes de rua cuja elucidação ocorre por técnicas comuns de investigação – oitiva de testemunhas oculares, gravação por câmeras de segurança, busca e apreensão", afirmou Aras.

Histórico
O texto diz que a captação ambiental feita por um dos interlocutores, sem o prévio conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público, poderá ser utilizada em matéria de defesa, quando demonstrada a integridade da gravação.

O presidente Jair Bolsonaro tinha vetado o trecho, mas os parlamentares ressuscitaram parte desses dispositivos anulados, incluindo a restrição ao uso das gravações.

O pacote anticrime foi aprovado pelo Congresso em 2019. O trecho que limita o uso das gravações ambientais não estava no texto original, e foi incluído pelos senadores e deputados durante a tramitação. Ao sancionar, Bolsonaro vetou essa regra atendendo a um pedido do então ministro da Justiça, Sergio Moro.

Ao justificar o veto, o presidente alegou que a proposta do Legislativo, ao limitar o uso da prova obtida mediante a captação ambiental apenas pela defesa, contraria o interesse público. Isso, porque uma prova não deveria ser considerada lícita ou ilícita unicamente em razão da parte que beneficiará, sob pena de ofensa ao princípio da lealdade, da boa-fé objetiva e da cooperação entre os sujeitos processuais.

No veto, o governo também defendeu que proibir o uso das gravações na acusação de um réu representaria um retrocesso legislativo no combate ao crime.

Segundo especialistas, a nova regra teria potencial para prejudicar a análise de processos envolvendo abuso a menores e idosos, violência doméstica, além de casos de corrupção.

A ação da Rede
No STF, a Rede afirma que a nova lei aprovada pelo Congresso contraria o entendimento dos tribunais superiores, entres eles o próprio Supremo, que admite utilização como prova da infração criminal a captação ambiental feita por um dos interlocutores, sem o prévio conhecimento da autoridade policial ou do Ministério Público, quando demonstrada a integridade da gravação.

Na ação, o partido defende a necessidade de o Supremo diminuir os "danos que tal alteração na legislação poderá causar em toda a sociedade brasileira em decorrência da potencial redução no já baixíssimo nível de condenações nas ações criminais em relação aos crimes cometidos no país".

A sigla diz ainda que a captação ambiental é essencial para a comprovação de fatos criminosos.

"Graves crimes contra a administração pública podem ter solução encaminhada com esta prova, já que muitas vezes são pessoas que participam do esquema criminoso que denunciam os fatos, gravando seus antigos comparsas e levando as provas à polícia, obtendo, até mesmo, os benefícios de sua conduta", sustenta a Rede.

"O próprio erário público, portanto, fica prejudicado com a citada mudança, uma vez que deixará de ser possível utilizar a captação ambiental por um dos interlocutores sem autorização judicial em casos como os de concussão, corrupção e prevaricação, por exemplo. Quanto de recursos públicos deixarão de ser recuperados em face da não utilização de tais provas? Com certeza, muito", completa.

A Rede aponta que a nova norma viola princípios constitucionais, como o da igualdade, "ao suprimir da investigação criminal importantíssimo meio de prova".

"Afinal, poderá o infrator utilizar, como meio de defesa, prova produzida de determinada forma, mas não poderá um cidadão alvo de criminosos utilizar prova produzida exatamente da mesma forma para comprovar que está sendo vítima de infratores", ressalta.

g1
Portal Santo André em Foco

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